Mensagens

A mostrar mensagens de dezembro, 2017

Tempo novo

Imagem
Indiferente à posição da Terra no seu passeio ao redor do sol, o tempo será novo ou velho consoante aquilo que fizermos dele. Demasiadas vezes, Janeiro é tão só uma ilusão. Os dias novos são aqueles que se inscrevem na nossa história pela forma intensa com que permitem cumprir os sonhos e a vontade, e, pelo contrário, são moribundos os instantes em que, contrariados, arrastamos os pés de encontro àquilo que não somos ou não queremos, mesmo que seja tudo o que os outros esperam de nós. Há muito de réveillon numa declaração de amor, num beijo, num sim ou num não que já tardavam, numa viagem, num livro que se escreve ou que se lê, numa conversa com vista para o coração, num concerto, numa música, na carícia de uma rosa encarnada, na madrugada que cheira a liberdade, no passeio numa praia deserta, no reencontro com a autoestima no enterro de uma qualquer ilusão. Sempre, sem foguetes, passas, espumante, cuecas ridículas de cor azul e as tão famosas astrológicas profecias. F

Natal 2017

Imagem
Quando os meus olhos se fechavam contra o colo das avós, com força, não fosse um olhar furtivo assustar o Menino Jesus, que trazia as prendas, talvez eu ainda não desconfiasse que o Salvador nasce milhões de vezes nos braços de quem nos sossega e acaricia, e que Belém é, afinal, a nossa casa e o melhor presente. O tilintar dos vidros na cristaleira da sala do primeiro andar sempre que corríamos com mais pressa, e às vezes descalços, eram sinos informais e sem bronze colocados nas torres com vista para o universo, muito mais do que apenas uma cidade. Por esse onírico campanário se desenhavam histórias de rapazes com asas e super poderes. Os sonhos desmentem o impossível e descalçam o medo que nos tolhe o caminhar. E muito mais do que no menino reluzente e gordo moldado no barro pelos artesãos oleiros do Redondo, Cristo resplandecia no musgo trazido das árvores mais velhas do olival. Em tufos enormes de muitos tons de verde, o musgo tinha ainda preso a si, a terra cúmplice das mulh

O Homem...

Imagem
O Homem que despreza as suas raízes é um pinheiro ornado de Natal no recanto de uma sala qualquer. Poderá até brilhar intensamente, tomando benefício das estrelas de purpurina, e pode até acontecer que a sala cumpra a magnificência dos poderosos, mas a árvore morrerá à fome e à sede, acabando sempre por tomar sepultura num desconfortável e reles contentor do lixo, por entre a amarrotada agonia dos papéis de embrulho que ajudaram na festa. O Homem que renega a sua história, cala a essência que tomou dos beijos simples do mel do berço, focando-se apenas nos vistosos sobretudos de outras peles que lhes possam cumprir a vaidade. Estes Homens são máscaras caras que se passeiam pelos dias de Natal e de todo o ano, contentes e risonhos por terem há muito esquecido que a mentira tem uma existência fugaz, e que para cada máscara existe sempre o fogo da verdade e a triste sina das cinzas espalhadas por uma quarta-feira que o calendário senta em Fevereiro ou Março. Dizem os outros Home

Os beijos que escrevem livros…

Imagem
Enquanto andamos pela Praça a brincar às escondidas ou aos Jogos Sem Fronteiras, um tio que passe por ali, e para quem corramos a saudar com um beijo, talvez puxe do porta-moedas, guardado ao lado dos cigarros Kentucky ou Definitivos, e nos dê uma moeda de dez tostões que guardaremos no bolso até acabar a brincadeira. Nas padarias vendem broas de azeite e de manteiga, e eu prefiro as primeiras; sendo quase certo que a dita moeda castanha saltará do meu bolso para a gaveta do balcão que a mulher de bata branca vai abrindo ao ritmo da saída dos papos-secos e dos pães de quilo e meio quilo. Assim se aguenta a tarde até à hora do jantar, quando a mãe abrir a janela para nos chamar: - Oh Zé Artuuuuur. Ao ouvir chamar pelo meu irmão, eu já sei que a duração do "ur" é diretamente proporcional à pressa que devo ter, sabendo assim se deverei ou não correr. Depois do jantar virão as tias e as avós passar o serão, e nós já de pijama, estafados pela brincadeira e com os dentes j

As paredes encarnadas...

Imagem
Por mais confortáveis e elegantes que sejam as gavetas das cómodas e os armários, para a vida só contam os instantes passados na cumplicidade do sol... e do luar. Para comprovar esta minha convicção, desmentindo simultaneamente os que apelam ao hipócrita recolhimento de si mesmos em mobiliário mais ou menos sagrado, apertem o cinto e venham comigo ao norte numa viagem de trabalho. Na noite gélida do Porto, subindo a escada de acesso a um dos meus restaurantes favoritos, o Mendi , de comida Indiana, apanhei do chão uma camélia caída algures de uma varanda pela força do vento ou da chuva. Era uma flor "de cabeça para baixo" nos degraus já muito gastos de uma velha escada, mas, uma flor é como um Homem e nunca deixa de o ser, nem mesmo quando morre. Apanhei-a, pu-la no bolso do casaco e deixei-a ficar por ali entre as chaves, enquanto comia o de sempre: uma Samosa de carne e outra vegetariana, o Murgh Karahi Masala acompanhado de arroz branco; tudo acompanhado por u