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A mostrar mensagens de outubro, 2020

Resistir

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Há ruas nascidas para serem rios de abraços, e olhares, cúmplices de abrigos, que, sem reservas, e de forma gratuita, nos oferecem uma casa, com janelas, aonde possamos morar. As palavras correm com a generosidade fluida das fontes, e nós guardamo-las em cântaros de barro, ao lado do mel, porque da mesma raiz nasceram para virem matar-nos a fome e a sede. Coabitam elas, e o nosso saciado sossego, em poiais de laje, erigidos como altares no recanto da casa de onde se avista a lareira, que se acende muito cedo, de madrugada, com restos de azinho, e nos retira as dores ao mesmo tempo que nos aquece o pão. Em dias eternos, em que nem a chuva consegue distrair-nos, e roubar-nos o sol. Tentei ser fiel à minha terra, Vila Viçosa, partilhando convosco o tanto que ela é para nós. Não consegui, por pura insuficiência de jeito e inspiração. Será muito mais do que tudo isto. E por este tempo difícil em que as ruas quase secaram, os olhares se “enfeitam” de interrogações, e as palavra

Não existem flores maiores que a esperança

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  O meu saudoso professor de Português, Padre João de Deus, explicava-nos a diferença entre o romantismo e o realismo, nas aulas do 11º ano da Escola Secundária de Vila Viçosa, socorrendo-se do exemplo de um casal. Em ambiente romântico, e em plena lua de mel, passeavam os dois no campo quando ele a alerta para o perigo de uma poça de água. - Minha flor nascida do melhor do tempo, procura o nenúfar que te segure o passo para não molhares a beleza desse pé delicado. Trinta anos depois, já imbuídos do melhor realismo, volta o casal ao mesmo sítio, e a mulher recorda: - Lembras-te desta poça de água e da frase tão bonita que então disseste? - Epá, deixa-te lá de parvoíces e não ponhas os chispes na água, porque ainda acabas toda encharcada. Os dias enfeitados de flores, frente a frente com o pragmatismo absoluto, revestido de alguma rudeza, parecendo-me a mim, que também aqui, nos estilos literários, tal como na vida, que a virtude se encontra no centro. No centro e no bom s

Não existe viagem que não seja para chegar a casa…

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Quem é do campo e desfrutou de andar descalço, sabe ler os instantes em que a terra reza, para que o Céu, que em si mesmo é generoso, possa acudir-lhe sem demora, e matar-lhe a sede. De um modo suave, com a tranquilidade própria de uma sexta-feira à tarde, intrometo-me neste diálogo, cruzando o altar informal que é o Alentejo. Para chegar a casa, porque não existe viagem que não seja para chegar a casa, ainda que às vezes, os nossos passos se dirijam para os antípodas do sítio que tem um telhado a proteger-nos o leito, as pantufas e a escova de dentes. A nossa morada anda rabiscada em tantos e tão díspares lugares, sendo imperioso, tantas, e tão dolorosas vezes, irmos até lá para que se dissipem as dúvidas e afinem as coordenadas. Tenho inveja do gato e saudades dos dias sem máscaras, e de quando os lábios partilhavam o seu deleite, ou não, com as palavras, embrulhando-as com a festa ou o vazio que a alma lhes ditava. Tenho saudades do bom senso, da lucidez da partilha, e dos