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A mostrar mensagens de agosto, 2020

Intermitências de “Amigos de Alex”

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A nossa geografia, que é gémea siamesa da nossa história, é a soma das coordenadas de todos os lugares que nos inventaram, com destaque, mais do que legítimo, para aqueles onde fomos felizes. E as memórias que desse chão guardamos, desmentem a aridez do pouco, que, às vezes, se vê, elevando-o ao estatuto de templo sagrado. Hoje, durante todo o dia, fui acompanhando, de forma intermitente, o programa da RTP1 sobre jardins históricos, transmitido a partir do Paço Ducal de Vila Viçosa. Fiz a foto num desses momentos, não porque o cantor esteja algures entre as casas das pessoas, escravas ou não, que serviam o duque, e mais tarde, o rei, mas porque ele está situado exatamente no ponto que unia a sala 7 com o acesso ao bar e às salas do pavilhão que abrigava a sala de professores da minha escola secundária. O edifício à esquerda era o ginásio, inventado a partir do picadeiro do Paço, e ao fundo vê-se o portão por onde entrávamos. O lago não existia, porque foi aqui instalado nos anos

Joaquim...

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  Sempre que jantava em casa da avó Natividade, na casa da Rua da Pascoela, ela ia levar-me a casa, depois, ao serão, subindo pela Rua de Santo António. Nesse passeio noturno, que no inverno tinha o prazer de uma das pontas do seu xaile, reparávamos na falha, e no reboco, de uma das fachadas do lado direito, que tinha a forma quase perfeita da cara de um rapaz. Daí até casa, inventávamos histórias que tinham como herói aquela criatura inventada a partir da fragilidade da cal. No outro dia, cinquenta anos depois, passei pela Rua de Santo António, e reparei que a “cara” do rapaz ainda lá está, embora um pouco enrugada, por mão de uma pintura qualquer. Esta semana estará à venda nas feiras do livro de Lisboa (Pavilhão D03 / Alfarroba) e do Porto (Pavilhão da Ibook), e nas livrarias nacionais, virtuais ou físicas, uma coletânea de 400 escritos da minha autoria, que por serem tão assumidamente da minha alma, ganhou o nome de “Joaquim“. Chamam-lhe poemas, mas eu vejo-os apenas como

Pensamentos...

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A nossa casa será sempre o sítio onde a alma nos pede para sentar, assim como esse beijo que não tem prazo de validade, entre outros importantes motivos, porque nele, o tempo não se sente passar. E em ambas as coisas, chão e beijo, não importa, por certo, que alguém, do lado de fora, nos acuse, e se ria de nós, porque montámos a tenda no deserto. Vê mais quem sonha, do que quem investe no oftalmologista, e se foca na visão imediata, e muito de perto. Em tudo onde a alma se cumpre, jamais se morre de fome, ou de sede, porque acreditar é ter trigo ali ao pé, e a fé traz sempre um rio, que corre solto, vida fora, sem margens, sem abismos e sem rede. Gosto de me sentar no silêncio, sentindo a tarde, e de puxar o meu rio, atando-o ao pescoço, como se fosse um cachecol, sabendo também, que o Homem é a nascente do dia certo, por ter na inspiração um interruptor capaz, de a qualquer momento, lhe trazer o sol. A minha ideologia será sempre aquilo em que acredito, sem coordenadas defin

A mesma idade...

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Dizem ser uma das tardes mais quentes do ano, e por isso esperámos pelas sete horas para virmos até aqui, aos campos de futebol de Vila Viçosa, ao carrascal. Eu e o meu sobrinho João. Estacionei o carro de costas para a Escola Secundária, e o termómetro marca 38 graus. Só desfrutei destas instalações no meu décimo primeiro ano, mas a tempo de numa manhã de fevereiro de 1983, termos ordem para sair das aulas e podermos desfrutar da neve. A primeira vez que eu via nevar. A minha amiga Lurdes Duarte foi ter connosco, e fez-nos uma foto no exato local onde agora estou estacionado, e a transpirar. Em Vila Viçosa, no carrascal, como na vida, os mesmos detalhes “geográficos” podem ser tanta coisa: inverno e verão... Soube hoje de manhã que partiu a Fernanda Lapa, e não sei porquê, entre este calor e as memórias da neve, penso em como lhe estou infinitamente grato pelas peças tão bem encenadas que me ofereceu. No princípio dos anos noventa, quando os muros tinham caído e nós trin

Se até a lua gosta de conversar com as chaminés...

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Não fora este silêncio onde as vozes se dissolvem pouco a pouco, como poderia eu escutar com exatidão aquilo tudo que me pede o mar? Adornei a proa deste instante com uma cruz de madeira e a fé de mil anos, e sem medo do fogo que o sol do meio dia impõe à face de quem ousa olhá-lo de frente, predispus-me a ouvir a sabedoria que acode à superfície das águas, soltando-se em frases cantadas ao sabor salgado da maré. Se até a lua gosta de conversar com as chaminés… Lições das praias desertas, mesmo para quem está, ocasionalmente, longe das águas, ou como se o tempo desse, finalmente, resposta, aquele, tanto, que o peito, em tantos dias, soube rezar. O pior inimigo do Homem é a mediania, a casa onde o sim ou o não se escondem, o asfixiar das dicotomias no quedo remanso de nada ter de justificar. A maior virtude do Homem é desvirtuar o tom opaco que poderá ter a sua própria pele, tornando-a transparente, sobrepondo o individuo à militância, na dispensa das epidermes vendidas a saldo em lojas