A Abelha, a Carocha e o João Ratão
Esta semana
cruzei-me com uma abelha que voava, estranhamente tranquila, entre jarras
cheias de flores artificiais.
Ignorou-me
nesta sua caminhada infrutífera pelo pólen, e o seu sossego será, quiçá, a
certeza de que, tarde ou cedo, chegará às flores verdadeiras que a possam
abraçar.
Nesta mesma
semana tive o privilégio de poder viajar com os meus sobrinhos, partilhando com
eles alguns detalhes do Alentejo pré e pós barragem do Alqueva.
O João
viajou ao meu lado, e o Luís atrás, devidamente protegido, como é natural, pelo
seu cinto de segurança, que acende uma luz verde no painel de comandos sempre
que é ativado.
Mas o cinto
do meio, ao seu lado, também estava ativado, e verde, porque com o Luís viajou
um amigo ou amiga invisível, personagem das muitas histórias de que ele gosta,
e que vive intensamente, insurgindo-se, por exemplo, com a imprudência da
Carochinha, que, desleixada, deixou um caldeirão ao lume.
Direi eu que
o dito marido, João Ratão, que nesse caldo morreu afogado, não seria também
grande figura, pois casou por interesse, após a dita e famosa Carocha ter
encontrado dez tostões ao varrer a cozinha.
O João e o Luís
já voltaram a casa, mas no banco de trás do meu carro, o cinto do meio continua
verde, porque dessa forma, os amigos invisíveis do Luís me farão companhia.
A semana
passada, como qualquer unidade de tempo, encerrou em si mesma o côncavo e o
convexo, o branco e o negro, o veneno e o antídoto.
Se a abelha
se antevê triste por andar numa rota errada, jamais poderei saber quantos
amigos invisíveis lhe afagarão o voo, compensando a ausência do pólen com
milhares de sonhos.
Acreditar é
a raiz mais profunda e generosa de sorrir.
Não procurem
ler-me, jamais, nos sítios inóspitos e improváveis por onde andam os meus
passos sozinhos, mas perguntem-me pelos sonho que me afaga a alma, e, já agora,
pelo Deus que me abraça no banco de trás das minhas viagens todas.
Em segurança
e de cinto (ou abraço) apertado.
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