Espaço 2021
Estaríamos pelos finais dos anos setenta do século passado, e nas salas meio arruinadas do Convento das Chagas, hoje a ilustre Pousada de Vila Viçosa, a nossa catequista pedia-nos para termos cuidado com as brincadeiras, sobretudo, porque aquele hábito de rodopiarmos sobre nós próprios para imitarmos a Maya do Espaço 1999, transformando-nos num animal qualquer, provocava-nos, isso sim, umas valentes tonturas, e nós acabávamos por cair sobre algum monte de entulho que servia de “Eagle 1”, a nossa nave, onde sob as ordens do Capitão Koening e da Doutora Helen Russel, viajávamos pelo espaço.
Ontem, vinte
e dois anos depois do mítico 1999, e alguns mais desde essas brincadeiras,
juntei-me com a minha catequista na missa das onze na igreja de Nossa Senhora
da Conceição. Ela, a minha querida Dona Bárbara Elisa, celebrava os seus
bonitos 94 anos, e eu, desde o coro, e com a ajuda da minha amiga Madalena
Barros, também da leva extraordinária dessas brincadeiras no Convento da
Chagas, cuidávamos da transmissão da eucaristia nas redes sociais, voando muito
mais depressa do que com qualquer “Eagle”, por mais sofisticada e criativa que a
inventássemos sobre um monte de entulho.
Não
resistimos a comentar, divertidos, estas coincidências.
A idade, de
facto, não existe, e o importante será sempre a forma como agarramos o tempo
para o fazermos nosso, voando depois, por entre o ímpeto de uma maior ou menor
ilusão, até ao cais que o coração nos diga.
À saída da
missa felicitei a minha catequista, e pedi-lhe para ter cuidado e não cair,
porque as bengalas às vezes resvalam na pedra demasiado polida.
Com quem
aprendi eu esta frase e o cuidado que ela pressupõe?
O afeto é
uma via com dois sentidos, e os nossos melhores amigos, aqueles que são a gente
que permanece porque se constituem a proteína da alma, nunca nos dizem para não
“viajar”, preocupando-se, isso sim, em dar-nos alento para não cairmos e
podermos chegar, por muito que se vislumbre a vertigem de uma ilusão.
E toda esta
tanta vida, quer no Convento das Chagas ou ontem, na Igreja de Nossa Senhora da
Conceição, sob o Olhar o e a “pretexto” da mesma fé que nos convida a sermos
maiores e melhores.
Nunca desdenhem
do impossível, porque ele só oferece certezas a quem não crê e não ousa sonhar.
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