Talvez por isso o Outono continue a ser ainda hoje a minha estação preferida...
Quando
caíam, castanhas, as folhas dos plátanos, sobre o caminho do liceu à Porta do
Nó, o Outono já tinha apagado as diferenças que existiam entre nós: os amigos
que podiam ir passar férias à praia já tinham regressado a Vila Viçosa com
histórias que iam partilhando connosco, e estávamos novamente todos juntos.
Talvez
por isso o Outono continue a ser ainda hoje a minha estação preferida.
Tínhamos
horários impressos e oferecidos por diferentes marcas, folhas mais ou menos
coloridas contendo espaços relativos aos dias da semana e às horas, e íamos
juntos até cerca das vitrinas da escola buscar informação sobre o plano de
aulas para a nossa turma. Depois jurávamos sobre as folhas imaculadas dos
cadernos e dos livros que aquele ano iria ser fantástico.
Havia
marmelos no fruteiro que a mãe às vezes cozia para a sobremesa do jantar, àquela
hora em que o corpo pedia agradavelmente um casaco ligeiro para enfrentar o
fresco libertador das agruras do estio.
Reluziam
diospiros nas árvores por cima do parapeito onde a marmelada e o doce de melão
secavam ao sol sob recortados pedaços de papel vegetal; e ao lanche comíamos um
papo-seco com geleia, um pouco antes de ir até à Livraria da D. Joana onde às
vezes assávamos bolotas no aquecedor para entretermos as mãos enquanto da nossa
conversa se soltavam milhares de histórias.
Ao
serão lia a Crónica de D. João I com a tia Maria e aprendia quem era o Conde de
Andeiro.
Sentado
agora junto à janela no primeiro dia de Outono de 2016, escrevo aqui enquanto a
memória se entrelaça nestes sabores e em todos estes detalhes.
O
entardecer trouxe uma brisa e a sala agradece-se assim aconchegada pela
penumbra que vou esticando até ao ponto de quase não ver as letras.
O
tempo cerrou uma cortina, “refrescou” lentamente o sol, pintou o jardim do tom
mel e castanho do repouso, e devolveu-me a casa, devolvendo-me afinal a mim.
É
isto o Outono.
E
estávamos novamente todos juntos…
E
tão bem aqui comigo, eu sei que os amores que cruzam o Outono são aqueles que nos
marcam a vida.
Talvez
por isso o Outono continue a ser ainda hoje a minha estação preferida.
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