Enquanto existirem palavras eu jamais viverei sem flores, sem um barco ou um avião...


Enquanto existirem palavras eu jamais viverei sem flores, sem um barco ou um avião.
E mesmo se a tinta secar e o papel persistir branco pousado sobre o tempo, eu moldarei as suas asas com a liberdade de onde brotam os meus versos, construindo uma aeronave que terá na forma e na propulsão quase tudo daquilo que eu sou.
As casas vazias e sem gente são o privilégio de brincar com o sol, colhendo das sombras que ele desenha sobre as paredes, o tecto ou até o chão, as histórias a que a pobre vidraça jamais se opõe desde que dispensámos as cortinas.
Como sempre…
Por volta das cinco da tarde a tia fará a limonada num jarro de louça em tons de caramelo que comprou ao contrabandista que visita clandestinamente o casão ao lado do nosso quintal e que também traz o “Cola-Cao” desde Badajoz; o tempo aqueceu e a porta do congelador do velho “Kelvinator” espreguiçar-se-á perante a minha vontade de um gelado feito de pudim “Predilecto” nas formas quadradas e com um palito a fazer de pau; talvez corra uma brisa fresca na Mata e no Rossio antes de nos sentarmos tranquilamente para jantar porque hoje passará a Marcha e a rua celebra o São Pedro com flores de papel que foram feitas ao serão.
Flores que nos beberam as palavras numa roda cúmplice do luar, flores como o meu avião…
Mesmo que possa tardar, esperarei sempre que Junho chegue para me despir a idade. Entre memórias e fé, tenho mundo suficiente para nunca desistir de ser criança.    

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