À escala microscópica


Há dias em que as árvores me beijam por muito mais do que apenas o olhar, deixando sobre o carro um ramo pequeno da sua imensa copa, e centenária história.

Poupando-o ao vento que a velocidade sempre ateia, apanho-o e trago-o comigo, sentindo-lhe os versos numa conversa entre iguais, que jamais terá fim.

Eu sou irmão dos detalhes ínfimos de todas estas árvores da minha terra, e quanto mais mundo me é dado conhecer, mais privilegiado me sinto nesta honra, à escala microscópica, de poder chegar até onde a Terra floresce e se renova.

Há quem aposte, e faça o contrário, fechando-se num espaço pequeno, e chamando sobre si o foco mais intenso que existir no mercado. Enormemente importante, é um facto que, então, ver-se-á grande, projetado sobre a parede branca.

Será um gigante, mas de apenas sombra.

No requiem da verdade, será uma valiosa ilustração, mas da carnavalesca legenda que não lhe pertence.

Eu gosto da viagem que me dilui no espaço todo do universo, e me transforma nesta anónima molécula da humanidade.

Desfruto de um tempo sem fronteiras aonde a diferença oferece o benefício do complemento, permitindo-me ter mais ar para respirar, e, um ar, indiscutivelmente mais perfumado.

Qualquer mar é uma estrada, o exótico é uma cor que estava à minha espera, qualquer religião é uma outra face do Deus que eu procuro…

E quando regresso a casa consigo entender as árvores nestes seus detalhes mais subtis.

Ser crescido é despir-se de pudores, predispondo-se ao sonho, ficando, assim, melhor preparado para ouvir, e sentir, o coração da Terra.

O pequeno ramo de oliveira que guardei no carro naquela manhã de ventania, já está meio seco, mas permanece no seu sítio, ali, entre o pouso da máscara e o telemóvel, afagando-me o pensamento na solidão de cada viagem, debitando, de passagem, todos os versos que tomou da lua.

A Pantera cor de Rosa?

É só para vos conseguir provar a tanta vida, nas tantas palavras que existem para lá das sombras, e daquilo que se obtém com a superficialidade do olhar.

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