O menino de Sacavém
O
dia amanheceu solarengo na costa do Barlavento junto a Porches, e apenas o
Caldeirão, passara já o meio-dia, me começa a revelar as nuvens, primeiro
dispersas e depois aglutinadas num tom cinza escuro, que da Ponte Vasco da Gama
me fazem ver a face oriental de Lisboa sob uma chuva intensa.
Há
gente e mais gente, em todos os recantos do aeroporto. Para lá da nossa língua pátria,
facilmente se escuta Inglês, Alemão, Castelhano...
A
zona das partidas é uma Babel que se escoa ao ritmo de chamadas para embarque.
Já
no avião, espreito pela janela oval que jamais algum Americano por mais
poderoso que seja, poderá mandar abrir, e desperta-me a atenção, no contexto cinza
deste dia de chuva, o vermelho da camisola de um menino, acompanhado por um
adulto, que junto a um portão de rede algures no extremo do aeroporto junto a
Figo Maduro, movimenta a mão direita em jeito de adeus.
Ainda
no outro dia à mesa do almoço e na grata companhia das minhas colegas,
recordávamos o tempo em que meninos, também nós íamos ver os aviões.
E
penso então naquele dia pelo início da década de setenta, em que empenhado em
mostrar-me Lisboa, o avô Chico, depois de me levar ao Jardim Zoológico, à Feira
Popular e à Fonte Luminosa, me trouxe à varanda do aeroporto, para que eu, pela
primeira vez, pudesse ver de perto, um avião.
Recordo-me
do espanto de então pela dimensão dos aparelhos. Eram bem maiores do que alguma
vez imaginara do cimo do tronco da Oliveira que há muito eu transformara em
avião no pátio da minha escola.
E
prometi a mim próprio que um dia voaria nas asas metálicas desta ave de
produção humana, indo muito para lá da mágica Ponderosa, a terra do meu
Bonanza.
O
meu avião acelera e descola da pista entregando-se aos céus de Lisboa. Rompe as
nuvens, e não consigo tirar da memória o menino de vermelho.
Hoje,
serei eu a ir no seu sonho?
Se
o tiver, que um dia o possa cumprir.
Que
possa mesmo cumprir todos os sonhos, até aqueles que são rotulados de impossíveis
por estes dias complicados dos cretinos Orçamentos das Finanças da Nação.
Fecho
os olhos traído pelo cansaço mas não adormeço sem pensar como todas as coisas
simples, e por mais simples e banais que nos pareçam, têm sempre a dimensão dos
sonhos de muita gente.
Viver,
ganha a dimensão de um dom.
Desfrutar
da vida e de todos os seus ínfimos detalhes, é então um retribuir de gratidão.
Mas
só ficamos na posse desta consciência quando nos despimos da vã importância que
estamos viciados a atribuir a nós próprios, e quando pomos de lado a bacoca
opulência de que gostamos de nos rodear, abrindo espaço à suprema inteligência e
arte dos simples…
Quando
menos esperamos, quando um anjo nos diz adeus…
NOS TEUS SONHOS DE MENINO NUNCA PENSAS-TE VIAGAR TANTO , COMO E BOM RELAIZAR OS SONHOS
ResponderEliminarRUI PEREIRA
Às vezes os sonhos não é tanto assim como pensamos, para quê sonhar?
ResponderEliminarQuando muitas vezes sai tudo ao contrário!
Tanto que eu gostava de realizar alguns sonhos fica a esperança...
M. Pereira