À boleia de um sábado de nevoeiro
Ousadas,
as nuvens desceram para nos beijar e de um claro cinza tingiram o mar, fundindo-o
com o céu.
Por
momentos, morreu a linha do horizonte, e só a intensa brisa com aromas de algas
e sal, denuncia a presença de um braço de oceano aqui por perto.
A
brisa, e a revelação de um pequeno barco ao longe, sombra escura e uniforme, assim
criada pelo contínuo biombo de nuvens que persiste e se eterniza entre a Terra
e o Sol.
E
há algures no barco, um Homem que lança a rede ao cinza que o envolve, teatro
de sombras, ritual de esperança, prece por alimento, mais a Deus do que às
águas. Ao Deus da fé, dos pescadores, ao Deus que os sinos recordam no seu
repicar compassado a cada quarto de um tempo, que não fosse o soar metálico de
um Avé de Fátima, e pareceria eterno.
Na
rua por debaixo da minha janela, surge de repente gente, um grupo que passa e
ri muito alto, enquanto acelera rumo ao vazio, procurando o mar. É sábado e
verão, e eles cumprem por certo o compromisso de festa agendado há muito no
calendário dos seus dias de labuta.
E
mesmo sem sol, bastam anedotas e gargalhadas para celebrar a chegada ao ponto
onde, hoje mais por fé do que evidência, se sabe que se está junto ao Atlântico.
Breves,
passam e regressam, restituindo o silêncio que só não resiste ao bater dos
sinos, e, entre os quartos de uma hora, ao ruído e ao voo de umas muito poucas
mas imponentes gaivotas de longas asas.
E
é a paz do privilégio deste momento que me oferece a ousadia de dispensar as reservas
e de me deixar ir com elas, as asas, os impulsos mágicos do meu pensamento, para
lá de tudo e para lá de todos, para os sonhos, para o espaço onde se bebe a
vida e se alimenta a construção do eu pleno, o eu feliz, para o altar onde nos
despimos de tudo o que não somos e se operacionaliza o matrimónio da nossa existência
com o compromisso indelével da mais fiel felicidade.
É
sábado e verão, é um dia sem sol e à minha frente há uma infinidade de cinza
que acredito, que sei, ser céu e mar.
É sábado e verão, é um dia sem sol e… juro-vos, vou ser feliz.
É a paz que sempre nos leva ao melhor de nós. A paz e a fé
ResponderEliminarRUI PEREIRA