A tarde de Maio
A
primavera sente-se muito para lá da perfeição de cores que nos encantam e
prendem o olhar, à medida que os nossos passos avançam pela vereda muito
estreita, caminho desenhado pelo calcar insistente da perseverança do Homem, trajecto
de terra aqui e ali invadido pela erva ainda fresca que brotou de um inverno
generoso de chuva.
Sigo pelo campo sem rota
Sou dono de mil caminhos
Por entre a vida que aqui brota
Entre estevas, poejo e pinhos
Mais
à frente, o rosmaninho impõe a sua cor arroxeada, que brilha intensa por entre
o quase monopólio de verde, e o momento impõe que o acariciemos, bebendo então as
mãos daquele odor único de uma alfazema brava que me recordará sempre o cheiro da
fé espalhada pelas ruas da minha terra em dias de passeio de Nosso Senhor.
E
aqui parados junto ao tronco de uma árvore sem idade, sentimos e lemos o norte
na muito natural e micológica bússola semeada pela brisa fresca.
Quem me dera ter-te aqui
E ir contigo mão-na-mão
Embora tudo me fale de ti
E me incendeie o coração
Há
uma paz que se colhe de tudo o que se sente, e também de todas as infinitas
memórias que nos assaltam e nos acompanham enquanto os pés avançam campo fora
fazendo-nos ressuscitar a cada flor, a cada cheiro; uma história e as histórias
de tantos dias felizes.
Paramos
à sombra de um sobreiro de onde se avista a ribeira que corre generosa e
deixamo-nos embalar pelo cantar perfeito de um cuco que nunca saberemos de onde
vem mas que se faz presente e nos alegra as horas.
Fecho
os olhos naquele esforço de quem quer dar força e primazia a todos os demais
sentidos, e registar e tornar eterno este momento.
Na terra com cheiro de flor
Dormi num sonho com o teu sorrir
Foi a hora de soltar o amor
E finalmente ver Maio florir
E
sinto-me em casa e colho do meu respirar profundo de mil aromas, todo o alento para
regressar ao caminho sob o sol que me beija despudoradamente, o sol sinto adormecer
com o cair da tarde, à medida que me “empurra” e me devolve à mesa dos amigos
onde o pão, o vinho e a conversa; me esperam todos para a hora da celebração da
amizade.
E
tu, sempre no meu coração.
Sou de aqui e sou teu
Sou deste campo risonho
Meu amor, para que eu seja eu
Jamais partas deste sonho
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