Gaiolas muito pouco douradas
É
Romeno, o bem-parecido motorista de táxi que entre vivendas rodeadas por
jardins, me transporta pelos estreitos caminhos da velha Inglaterra até ao
aeroporto de Gatwick onde vou apanhar o avião para regressar a Portugal.
A
conversa leva-nos pelo futebol, pela miragem que a Comunidade Económica Europeia
/ União Europeia constituiu para os nossos povos após as mortes de Oliveira Salazar
e Nicolae Ceausescu (tão longe e afinal tão próximos), a desilusão após a
adesão, a morte anunciada do Euro e a constatação do facto de os tratados
apenas expressarem fictícias uniões políticas numa Europa onde persistem as
desigualdades e onde continua a existir o conjunto dos povos que servem e dos
povos que são servidos, ou se quiserem, os pobres e os ricos, respectivamente.
A
união permitiu que os “criados” se sentem à mesa com os “senhores” mas na hora
da festa só os últimos se divertem porque os outros vão para a cozinha tratar
da louça.
A
conduzir um Mercedes, à esquerda como mandam as regras do país onde trabalha,
este rapaz concordou comigo quando comentei a beleza das casas que íamos vendo
no caminho, mas logo me disse:
-
Para mim são bonitas e impossíveis pois as mais baratas custam meio milhão de
libras.
Qualquer
coisa como seiscentos mil euros.
Ele
é dos que lava a louça.
Já
no aeroporto resolvo entrar num dos restaurantes para concretizar um almoço
tardio em que acabei por comer a pior pizza do meu curriculum, uma roda de
massa crua enfeitada de rúcula e de camarões que não acabaram de descongelar.
No
imenso restaurante não consegui visualizar nenhum empregado que não fosse
Português. E todos simpáticos na hora em que descobriram que eu também era,
desarmando-me da coragem de reclamar pela pouca qualidade da malfadada pizza, numa
assumida solidariedade lusíada.
Não
sei o nome da rapariga de Barcelos que mais falou comigo e me disse que o regresso
a Portugal se vislumbra impossível. Trabalha muito por aqui, tem imensas saudades
da família, mas este é o melhor sítio que tem para viver.
Definitivamente,
nós também somos dos que lavamos a louça.
Depois
de me despedir dos meus “amigos” Portugueses, encaminhei-me para a porta de
embarque passando antes na emigração para mostrar o passaporte. Não fazendo
parte do Espaço Schengen talvez o Reino Unido seja menos hipócrita não
aceitando ser conivente neste disfarce de uma Europa sem fronteiras quando as
verdadeiras fronteiras, as sociais, são muros intransponíveis.
O
caminho é longo até ao avião e oferece-me tempo mais do que suficiente para rever
o “filme” da minha última hora de vida, de buscar justificações e de me
recordar das palavras do meu taxista Romeno na altura em que lhe expliquei que
de adepto de Mao Tse Tung até presidente da Comissão Europeia apoiado pelos
partidos mais à direita, se fez o percurso do Mister Barroso que ele
sistematicamente colocava na conversa e o homem que em 2004 se demitiu de
primeiro-ministro para assumir o cargo garantindo o apoio ao desenvolvimento do
país (está à vista!):
-
Os políticos são na verdade como as prostitutas, e vendem-se para chegar ao poder.
Só
em parte concordo pois as prostitutas só vendem o corpo e não a alma, e para
além disso, fazem-no muitas vezes para poderem subsistir, e não apenas pela
sede do poder e dos seus associados e pérfidos benefícios que estão muito para
lá das necessidades básicas.
A
comparação é pois desprestigiante para as prostitutas.
E
a Europa é assim porque tem de ser assim, tendo como tem, semelhantes líderes
ao leme.
Quando
saí do edifício onde me encontrava antes de ir para o aeroporto, o rapaz Romeno
estava entretido a dar brilho ao carro e, garanto-vos, tinha o mesmo ar da
fantástica Rita Blanco, a Maria do filme “A Gaiola Dourada”, quando passava o
pano pelo corrimão do imponente prédio de Paris.
Tiques
e gestos dos povos que servem, na ficção, e pior, na realidade.
Não vou perder o meu precioso tempo com causas perdidas. Gosto de viver o que de melhor a vida me pode proporcionar no presente, com os olhos postos no futuro. O passado, é passado. E é com tristeza e alguma mágoa que o digo, pois orgulho-me de ter um passado recheado de grandes e bons momentos partilhados com grandes amigos. Mas, em todos os rebanhos há ovelhas negras, e a esses reservo-lhes a indiferença e o desprezo na certeza de não necessitar nada deles. Valorizo o Melhor da vida e as pessoas que o compoem. É a esses que possibilitaram a realização de sonhos que vai uma palavra de grande apreço, consideração e os votos de muitas felicidades.
ResponderEliminarAgora por Gaiola Dourada, o filme mais comentado dos últimos meses, que bateu recordes de espectadores em Portugal.
ResponderEliminarA interpretação da Rita Blanco é simplesmente fantástica. Há situações engraçadas, muito portuguesas, uma vista maravilhosa sobre o nosso Douro o que sabe sempre bem terminar um filme assim. Material que é nosso e do melhor
É bom ver um filme leve sem ser pretensioso, um filme “ normal” e com algumas falas em Português (poucas...mas vá), coisa rara e nunca vista, pois temos sempre aquela preocupação de dizer que somos sempre alternativos e que só vemos coisas pseudo-intelectuais mas que infelizmente só um mini mini nicho é que vão ver e por isso as salas estão sempre vazias.
Venham de lá mais uns tantos filmes assim e vamos encher as nossas salas.
Gostei da Gaiola Dourada e gosto muito do que escreves
P