Estes valiosos dias de prata
Não
resisti e fui hoje pela manhã revisitar a foto do vosso casamento que guardo
religiosamente no meu álbum das preciosidades. Lá estamos todos alinhadíssimos no
altar principal de São Bartolomeu, elas com os penteados dos anos oitenta que
esticavam os cabelos até ao infinito (à excepção da Béquim que tem o cabelo
apanhado e parece estar a esconder uma banana no toutiço), e nós, todos com gel
na cabeça e ao melhor estilo “Encontro Nacional dos Amigos do Blazer Azul
Escuro”.
É
interessante olhar em detalhe cada rosto e parece incrível como já passaram 25
anos.
Crescemos
muito desde essa manhã fria de um sábado solarengo em Vila Viçosa, sobretudo pela
forma como fomos preenchendo a vida de coisas importantes e boas, e acho que
todos nos recusamos a envelhecer porque o brilho dos nossos olhares carrega
ainda hoje esse mesmo de então a que a foto dá verdade.
Talvez
hoje já não fossemos todos juntos para a Rádio Campanário gravar uma cassete de
gemidos e suspiros inspirada na canção da Brigitte Nielsen e do Falco, “Body
next to body”, surpresa na vossa chegada a casa na noite de núpcias e que
acabava com um grito de “Oh mãeeee!” dado por uma muito respeitada amiga nossa;
eu, o Manuel e o Paulo Geadas teríamos muito mais à-vontade para ir a uma
farmácia comprar preservativos para vos enfeitar o quarto, pois na altura
andámos a ensaiar a compra durante três meses e acabámos a faze-lo em Estremoz
no dia em que fomos à PalloRam comprar os inevitáveis blazers azuis-escuros;
também não sei se uma outra e muito distinta amiga nossa (que vai por certo ler
este texto) se atreveria a pedir-me, quando me visse de batom na mão a enfeitar
o vosso carro: “Oh Quim, desenha-lhes aí uma boga de cada lado”; talvez
fossemos mais selectos na escolha dos materiais que penduraríamos no quarto,
dos braços do crucifixo que encimava o vosso leito matrimonial; pensaríamos por
certo alguma vez antes de bater à porta das pessoas com quintal para que nos
dessem verduras e flores para vos decorar a igreja onde também pendurámos as
melhores colchas brancas que havia nas nossas casas; por certo há já melhores
formas de arranjar malmequeres azuis do que naquele tempo em que acabámos com
as mãos da cor do céu; não sei se o Manuel ainda cantaria o salmo no mesmo tom
que então dava à voz quando não era dirigido por gestos eléctricos e
electrizantes…
Ou
talvez ainda fossemos capazes de fazer tudo isso, e quiçá muito mais e com mais
requinte, o tal requinte que vem associado ao charme na chegada dos cabelos
brancos, e que beneficia ainda da descontracção que a idade sempre nos oferece
de presente.
O
que é certo, e o que é realmente importante, é que há uma história de amor para
contar tecida por 9.132 dias (e contei os anos bissextos) em que de perto e
dessa fantástica janela sem trancas que se chama amizade, pudemos todos testemunhar
a vossa felicidade vivida a dois e mais tarde a três.
O
amor até pode ser louco, é verdade, mas é muito mais um aglutinador de vidas na
conquista de possíveis e impossíveis para o alinhamento do destino com as
vontades que os sonhos grandes sempre expressam.
A
louca vontade dos poetas que sempre se recusam a matar a liberdade e que na
meta além no futuro, não admitem outro desfecho que não o êxito, o sucesso.
Nós
sempre soubemos que, pelo amor, tudo iria dar certo.
E
de sonhos, percebem vocês, assim como da ousadia de nunca os trair ou fazer
abortar mesmo quando os escravos da razão esvoaçam em bandos por sobre os
nossos dias agoirando a desgraça ao jeito de uma tragédia das piores, apelidando
de loucura a nossa desbravada e destemida ousadia.
Manuela,
Zé Maria e Marta, muitos parabéns pelas Bodas de Prata que hoje comemoram e que
nós comemoramos convosco.
Foi
um prazer esta viagem compartilhada que nos trouxe até aqui. Queremos seguir
agora ao encontro do Ouro.
E
pode ser pelo mesmo caminho: sorrisos, gargalhadas, fé, cumplicidades, sonhos,
ousadia, criatividade, afectos, palavras, felicidade, música, viagens,
petiscos, canções, generosidade, poesia, ambição, non-sense, garra, liberdade…
E
esse sempre e tão inevitável amor.
Até lá.
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