Finisterra
São
sinuosos os últimos metros do caminho.
Do
lado esquerdo da estrada e ao fim da escarpa íngreme, o Atlântico revela-se em
matizes de cinza, morto o azul pelas nuvens que neste dia de Agosto nos querem
impor a chuva. Aqui e ali, o sol aproveitou a fragilidade das nuvens, e é de
prata, o rendilhado que os seus raios oferecem à água.
E
a água nunca resiste às rochas e sempre se desfaz em branca espuma contra todas
as que sustentam a ponta de terra que sustenta o farol.
Não
há gaivotas, há corvos em constante voo negro por cima de nós e por entre as cruzes
de pedra e as lápides que temperam de misticismo este lugar.
A
bravura do mar perante as limitações do Homem impôs o nome “da Morte” a esta
Costa onde a salvação deu à Virgem o natural título “da Barca”.
Acreditou
o Homem, por ler na Via Láctea, que este sítio era o Fim do Mundo, o Fim da
Terra, Finisterra, e aqui marcou o quilómetro zero do único Caminho de Santiago
que não termina no túmulo do Apóstolo, tendo lá um inédito ponto de partida.
O
que são afinal a morte e o fim, se não apenas e só, explicações simplistas do
Homem rendido às suas limitações, aquelas a que o tempo se encarregará sempre de
pôr o rótulo de ridículas.
A
via crucis acabou num túmulo vazio e
este mar que parecia o fim, é afinal o princípio de um novo mundo. A pedra da
morte é tão-só o cais de embarque de todas as esperanças.
Neste
final de tarde, a brisa que vem do mar é fresca, abraça-nos e dá-nos um alento suplementar
na caminhada quando abandonamos o farol para o reencontro com as nossas vidas.
E
não há nuvens, nem corvos e nem morte que nos façam desacreditar que este quilómetro
zero é um tiro de partida.
Quando
nós queremos muito e temos fé, até o silêncio que parece a morte, é a
oportunidade para o reencontro da memória com todas as eternas palavras doces
que um dia fizeram grande, a nossa alma.
E
siga a viagem na legitimidade de todas as esperanças.
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