Passeio numa noite de verão
Depois
da visita a uma esplanada da Praça no período antes do jantar, na companhia da
Manuela, e sem que qualquer brisa fresca passasse por ali, eu e o João Paulo
não nos demos por vencidos e fomos pela noite de Vila Viçosa procurar o dito
sopro que nos aliviasse do dia de calor.
Como
sempre subi a Corredoura e encontrei-me com o meu amigo à porta da casa dele
naquele pedaço de rua que será sempre mágico para nós pois foi ali que mais
brincámos nos tempos em que a D. Joana Ruivo, desde a Livraria Escolar, e o Sr.
Domingos, desde a sua loja, nos supervisionavam as actividades lúdicas no
passeio em frente ao café do Sr. Cândido.
Lena
Pereira, também te recordas? Nestes dias quentes de verão nunca faltavas.
Subimos
já juntos até ao canto da Praça reparando que o termómetro da Farmácia Torrinha
marcava 32 graus. Nada mal para as 10 da noite.
O
canto da D. Catarina era sempre um bom poiso. Parámos.
O
sítio está igual mas… não, já não se está bem por ali. A D. Catarina e o Sr.
Julião já não estão sentados à porta a dar dois dedos de conversa com a Ana e a
Licínia da Farmácia.
Reparamos
que há muita gente sentada na Estátua do Henrique Pousão, talvez a brisa tenha
subido a Praça. Puro engano, nem ali nem mais acima junto a São Bartolomeu,
nada de fresco.
Paramos
à esquina da igreja, apreciamos o Castelo visto desde ali e damo-nos tempo para
umas valentes gargalhadas com base numa mensagens de telemóvel que tinham chegado
entretanto. Modernices… mas gargalhadas era coisa a que estávamos muito
habituados naquele sítio quando entre disparates e Jogos sem Fronteiras,
brincávamos no quintal da avó do João Paulo ali à esquina da Rua de Santa
Luzia.
Fazemo-nos
ao Carrascal apreciando o novo hotel Marmorium e aí à porta encontramos o Zé
Ganchinho que também anda à procura da brisa fresca mas que vem em sentido
contrário. Actualizamos os ficheiros e despedimo-nos com a recomendação do Zé:
-
Sigam para o Rossio porque parece que ela, a brisa, quer instalar-se ali.
Seguimos,
encontramos uma “multidão” de gente sentada em todos os bancos que parecem
estar na sala de espera da brisa fresca que, definitivamente, também não mora
ali.
Seguimos
sempre lentamente e naquele ritmo de arranca… e pára, quando uma fachada, uma
janela ou uma árvore nos dizem qualquer coisa.
Aqui morava a… não te recordas?...
aquela que… ah… era tão burra… pudera não ia às aulas e passava a vida no
Jardim das Damas.
E mais ali era a loja da…
ah pois era… vendia gelados de refresco… e as diarreias que apanhávamos…
Não, a casa da minha avó
era só até esta janela… e aqui quem morava?... ah pois era,,, era sapateiro não
era?
Damos
por nós a virar à Esperança, já na Avenida em frente à Escola das Raparigas e
da Árvore do Coração que agora virou rotunda de acesso aos Capuchos.
Mesmo
debaixo das laranjeiras não há brisa que se sinta.
Mais
uma paragem desta vez imposta pelo Cine-Teatro.
Olha, e quando vínhamos ao
cinema e abriam as portas porque estava calor… e de inverno era um gelo de se
morrer lá dentro…e o Manuel adormeceu… e o que se chorou quando passaram aqui “O
Campeão”…
Continuamos
pela Avenida abaixo e até ao lago há gente em todos os bancos e as esplanadas
estão cheias de Calipolenses que tendo desistido de procurar a brisa, compram
fresco a copo no gelo de uma bebida qualquer.
Paramos
junto à Fonte Pequena para concluir a conversa. Eu já cheguei a casa e o João
Paulo ainda terá de subir parte da Corredoura para chegar à sua.
As
bicas da fonte estão a correr e não fosse cá por coisas e mesmo agora descia os
degraus e entregava o pescoço à água de uma das três bicas.
Despedimo-nos
e eu entro em casa.
Os
meus pais estão às escuras e com as janelas abertas, estão a ver se enganam o
tempo e caçam a brisa que… nem vê-la.
Dois
dedos de conversa e… cama.
Deixo
a janela para o Terreiro do Paço devidamente aberta mas reparo que o cortinado
nem só minimamente se agita.
Não
tenho sono e entretenho-me no escuro a ouvir o som de uma guitarra e das vozes
de um grupo que veio passar o serão até à Estátua do D. João IV. A viola ainda
se aguenta mas as vozes… foram elas que por certo espantaram a brisa fresca.
Mas
adormeço.
Tranquilo
e feliz.
Sou
de aqui. Estou em casa. E sem saber, já tinha tantas saudades destas "caças à brisa fresca".
Vila
Viçosa, para sempre, a minha casa e a minha gente.
E não só no verão, claro.
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