Suas Excelências, os “Ex’s”
Desde
sempre me habituei a conviver de perto com o ditado: “se queres ser bom, morre
ou ausenta-te”.
É
um facto que a morte de alguém nos “adoça” o coração e tem o condão de aliviar
os juízos negativos, mesmo em relação a pessoas com que não simpatizávamos
muito. Por um lado, porque não nos sentimos bem a “bater em mortos”, no
verdadeiro sentido do termo, por outro porque delegamos em Deus, o dito
julgamento, e de caminho, por precaução, não vão os finados ter algum poder
misterioso e fatal que nós desconhecemos, e venham acelerados das mais
profundas trevas para nos infernizar os dias.
A
ausência tem efeitos semelhantes mas por não envolver uma componente mística e
metafísica, tem sempre menos eficácia e menos impacto de perdão. Passa a ser
uma questão de tempo e de alívio da memória.
Nos
últimos tempos, tenho-me apercebido que é total a adequação deste ditado à
política Portuguesa.
Por
intolerância a telenovelas, programas de entretenimento, concursos e “Big
Brother’s” ao estilo cabaret da mais ordinária coxa, circulo muito pelos canais
de notícias das três estações nacionais, tendo assim o “privilégio” do convívio
diário com o saber, a clarividência e a excelência dos “Ex’s”.
A
“painelar” em conversas mais ou menos alargadas, os ex-Ministros das Finanças
sabem todos como retirar o país da crise e sabem quais as medidas que devem ser
tomadas para o conseguir com eficácia e em menor tempo.
Ex-Primeiros-Ministros,
ex-Presidentes da República, ex-líderes partidários, ex-Ministros da Saúde,
etc., todos sabem sempre o que fazer. E cheios de certezas.
É
interessante a forma como os ditos indivíduos são apresentados pelos
jornalistas, sempre como ex qualquer coisa, justificando-se por essa via a sua
presença e antecipando-se desde logo, a pertinência e a legitimidade das suas
achegas.
Este
fim-de-semana, o ex-Presidente da República, Jorge Sampaio, deu uma entrevista
ao Expresso, e foi ver a forma decidida como opinou sobre todos os assuntos, sobre
as suas soluções para a sustentação do Estado Social, ele que em 2004 ouviu
tudo e todos para conseguir tomar a decisão de empossar Santana Lopes com
Primeiro-Ministro. Então, até os moribundos foram obrigados a subir as
escadarias do Palácio de Belém, e para o que se viu...
-
Pois… Havia também aquela questão de matar a liderança de Ferro Rodrigues no PS
e esperar pela entrada de Sócrates…
-
Ok, mas isso não interessa nada.
Este
aumento da clarividência e lucidez após a retirada dos cargos, justificará
quiçá a facilidade com que os políticos se reformam no nosso país, algo que até
deveria ser incentivado, pois todos eles reformados, e talvez a crise se
resolva por si só. Mas por favor, com a reforma mínima ao nível da dos trabalhadores
rurais.
No
fundo, e sabemos que é essa a razão, há um deficit grave na formação dos nossos
políticos, muito treinados para a tribuna e para a palavra, e jamais treinados
para a competência e para a arte do “fazer acontecer”.
É
grave essa discrepância que à semelhança da Gripe das Aves ou da Doença das
Vacas Loucas, poderia ser designada por Incompetência dos Papagaios, patologia
grave com manifestação de sintomas de amnésia e desonestidade intelectual.
Há
não muito tempo, em Julho do ano passado, um famoso “ex” felicitou os médicos
pela sua greve, gesto heróico em defesa do Serviço Nacional de Saúde que em seu
entender era "uma das conquistas mais importantes na normalização
democrática após o 25 de Abril". "Perceberam bem todos o que estava e
está em jogo, salvar ou não salvar o SNS, que está ameaçado", afirmou.
Meio
ano depois, e na hora de escolher um hospital, este ex-Presidente da República,
Mário Soares, exemplifica e manifesta todo o seu verdadeiro respeito pelo
Serviço Nacional de Saúde buscando um hospital privado.
A
não ser que goste tanto dele, que não o utiliza para não o desgastar, numa
atitude mais ou menos ao jeito de quem tem um fato novo e só o veste em
ocasiões especiais, não vá ele ganhar algum desgaste e nódoas.
De
facto, isto de ter de fazer algo depois de tão bem opinar, é mesmo uma grande
maçada.
Por
fim e no momento presente, que o tempo corra veloz, que os actuais ganhem rapidamente
estatuto de “Ex’s” que nós até lhe pagamos a “Pensão de Alimentos” só pelo
prazer e alívio do divórcio.
E
até podem ir para os painéis de opinião ganhar alguns trocos que nós não nos
importamos. Afinal de contas, o exercício do zapping é tão relaxante.
Como sempre mais uma bela crónica
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