A raiz de milhões de flores
No
Portugal dos anos sessenta e setenta, a vida era tudo menos fácil para a
maioria das pessoas, recordo-me bem.
Aqui
por casa, o meu pai esteve desempregado por um longo período e foi preciso
"esgravatar" muito para que nada nos faltasse, com a minha mãe a
trabalhar objectivamente por dois e a esticar o dinheiro para chegar para
quatro.
Nunca
nos faltou nada e muito também pela ajuda da família e de muitos amigos.
Mas
um dia o meu pai arranjou emprego na mesma instituição onde ainda hoje
trabalha, a Fundação da Casa de Bragança, e no serão do primeiro dia de
trabalho, já depois de nos deixarem a nós a dormir na nossa casa à Rua de Três,
os meus pais foram em silêncio até à porta da Igreja da Senhora da Conceição,
no Castelo, rezar e agradecer o trabalho e a força recebida durante esses
longos dias difíceis.
A
minha mãe caminhou então descalça desde a nossa casa, faz hoje precisamente
quarenta anos.
Eu
tive conhecimento desta história muitos anos mais tarde, já adulto,
beneficiário então dos muitos frutos semeados pela fé dos meus pais sobre as
calçadas frias de Vila Viçosa algures numa noite de primavera; ao jeito dos
muitos frutos que a sua fé semeou em mim e no mais profundo do meu ser.
E
a fé é o segredo de tudo aquilo a que chamamos e parece magia.
Hoje
é dia da criança e num tempo que parece querer demonstrar que são genéticas as
dificuldades neste país, quis deixar aqui esta pequena história da minha
infância, como mote para a esperança.
Porque
por sobre todos os dias tristes e duros, a fé e o querer conseguem sempre fazer
despontar milhões de flores.
Desistir
é que não vale.
Digo-o eu com toda a legitimidade, ainda hoje e sempre, a criança mais
feliz do mundo e com os melhores pais do universo.
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