Há noites que deveriam ser eternas
Por
mais que se esforce, jamais a chuva conseguirá apagar o brilho incomparável que
Janeiro sempre oferece ao luar.
Sentimo-la
cair e palpamos o seu desespero pela inevitável derrota, constatando o ritmo
irregular com que bate na vidraça: lento e a parecer algo hesitante, depois
rápido e muito intenso… e por momentos desaparecendo como que rendida e a
pretender desistir desta tão inglória luta.
A
nossa mesa é junto à janela acossada pela água, a janela que permanecerá
imperturbável durante toda a noite e através da qual o luar nos revela o
descanso de todos os barcos, grandes e pequenos, os heróis que unem as margens
do rio, os “passos” seguros do Homem no milagre de caminhar sobre todas as
águas, que não só as do rio, já que o mar está logo ali um pouco mais à frente.
Em
cima da mesa onde uma vela arde na vulnerabilidade da chama abandonada e
totalmente à mercê do vento soprado pelas nossas vozes à conversa, há palavras:
as ditas, as dos gestos e as dos incansáveis olhares; muito mais do que comida
ou o vinho tinto devidamente “aceso”, se é pelas palavras que os afectos se desprendem
de nós e se constroem as pontes que tal como os barcos, ligam margens e unem
vidas...
Quando
um Homem quer muito, assim, não há qualquer ponte que persista por fazer.
Basta
tão-só dar… e dar-se.
Do
lado de cá do luar, aqui onde a janela rasga a parede forrada por tantas
memórias, fragmentos fotografados do passado de muita gente, brilham então as
pontes… brilha a amizade sempre muito mais do que a pobre vela acesa, enquanto
sentimos que é por ser simples que este momento é afinal tão grande.
O
conforto quente da amizade na noite de uma chuva que persiste.
Ouço
a chuva, e não a vejo, porque quando por instantes deixo o olhar voar pela
janela, ele vai para bem mais longe no impulso do pensamento que te resgata de
todas as distâncias e te faz presente.
E
tenho a noção de que na face me assenta um tonto sorriso sempre que estas vias
da memória te trazem até mim.
Por
mais que se esforce, jamais a chuva conseguirá apagar o brilho incomparável que
Janeiro sempre oferece ao luar.
Mas
nós conseguimos…
Acontece
assim, às vezes, à volta de uma simples mesa, construindo pela amizade as
pontes que unem as verdades das nossas vidas, por palavras… e quando o coração repleto
de amor, nunca está só e faz sentir que tudo vale mesmo a pena.
Há
noites que deveriam ser eternas… como o meu amor por ti.
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