Os amigos e a poesia
Sob
o luar maior de Lisboa e nas vielas do bairro mais alto da cidade, aquele que tem
cor de sardinheiras, tom de fado, e que no cimo da colina parece querer agarrar
a própria lua, cheia se faz a noite ao redor da mesa de todos os afectos.
A
noite perfeita tecida pelos instantes em que a poesia se solta dos olhares, dos
abraços, de todos os gestos e das palavras dos amigos.
A
minha história tornando-se mais feliz assim entrelaçada nas histórias daqueles
a quem o coração oferece a magna coroa e os torna “a minha gente”.
E
a nossa idade, como a nossa história, é muito mais medida por gente e afectos,
do que ditada pelo tempo e pelo passivo percorrer dos dias.
A
noite perfeita e intensa faz-se naturalmente pequena até ao momento em que o
sol surge no horizonte e me desperta para o privilégio de olhar o Atlântico num
desvario de azul que só nós, os marinheiros de sangue e alma, conseguimos
entender.
O
mesmo sol que pela hora de almoço parece fazer-me rota por entre a lezíria até
às margens do Sorraia.
Lá
no alto, em Coruche, a Senhora do Castelo, guardiã do Ribatejo, dos campos e da
gente; faz-se cúmplice da poesia, que por palavras e música, enche o domingo e
os degraus fronteiros à esplanada onde todos os que vieram se abrigam à sombra.
A
poesia à solta, cumprindo o seu destino incompatível com paredes e muros, assim
livre ao sol da lezíria.
E
é tão bom sentir que as minhas pobres palavras se fazem poesia na voz e no
sentir de muitos.
A
poesia é de quem a sente, muito mais do que de quem junta as letras e lhe dá a
forma de palavras.
Já
não falta muito para que a lua cheia volte a ser rainha e me tempere a noite de
uma inédita e doce claridade. Nos canteiros da Mina e da Natália, um pouco
antes do jantar, cheiramos flores afagando-lhes as pétalas: privilégios únicos
do campo.
E
a amizade regressa fazendo deste fim-de-semana um ciclo ao redor dos afectos,
das palavras e da poesia.
Assim sou feliz.
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