SOPHIA
Recuso-me
a deixar de ser menino…
E
aqui no mar da Granja, o eterno novo mar do norte que nunca se cansa de falar comigo,
reconheço em cada detalhe por entre a água e o areal, todos os mistérios revelados
nas tardes em que lá longe ofereci os meus ouvidos à bênção de um velho búzio.
Menino
nascido de um búzio deste mar… ou do mar grego que banha as férteis planícies de
Cós, ilha, musa, pátria de deuses e irmã cúmplice da história da liberdade.
Aqui,
com um antes e um depois, um tempo dividido mas sempre sob o signo de sonhar;
sou um poeta com o canto e a herança de Orfeu, e um eterno apaixonado com a
fidelidade de Eurídice fugindo às garras da cobiça do apicultor Aristeu.
Com
as cores rebeldes de um coral, sou vadio, um Cristo cigano entregue às
navegações que a alma lhe impõe, na geografia da vontade que dá um nome, o meu
nome, a todas as coisas que por eu tanto querer já se fizeram minhas.
E
juro que serei fiel a mim, e serei sempre eu, aqui em frente ao mar vivendo intensamente
o hoje em que tudo acontece.
“No
Hoje, nasci... no Hoje, vivo... no Hoje, morrerei um dia”
Aqui
em frente ao mar e ao jeito de Sophia, que mais do que a rima que lhe dá o
nome, é a própria poesia.
Sophia
de Mello Breyner Andresen torna-se hoje a segunda mulher a entrar no Panteão
Nacional. Depois da voz dos deuses, Amália, completa-se um ciclo com a mestra
das palavras desses mesmos deuses.
Juntam-se
aquelas que eternamente no Luso Olimpo, são as palavras e a voz maior da glória
do nosso povo.
Um
dia ainda menino e na minha Vila Viçosa, com a ajuda da Biblioteca Itinerante
da Fundação Calouste Gulbenkian, li de Sophia, “A Menina do Mar”.
E
mais do que um livro, foi um búzio carregado do som e de todos os mistérios e
encantos da poesia, que transpira até da própria prosa; a poesia que me tomou
pela mão ao jeito de um convite:
-
“Vem comigo, no caminho eu te explico”.
E
por aí vamos.
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