E as palavras saltam em catadupa para a folha que já esqueceu o que é estar vazia
Na
estrada às vezes longa que liga a solidão ao amor, que é o mesmo caminho que
toma quem vem da lágrima triste até ao estar feliz; existe uma “área de serviço”
um pouco antes da portagem, onde os amigos nos esperam à volta de uma mesa para
nos mimarem e animarem.
Um
chá, uns bolos, infinitas palavras, e aquela força que passa num abraço…
Porque
a portagem às vezes é cara.
O
inverno deixou sem folhas as árvores do campo à frente da minha janela, mas
compensou-me pelo verde que semeou na erva farta que então cresceu. E sem a
copa das árvores como densa e impenetrável cortina, o sol de inverno pôde
beijar a terra e fazer desabrochar um tapete amarelo de infinitas Azedas que
hoje me enfeita a vista.
No
outro dia e depois de estacionar o carro, não resisti e colhi algumas para
voltar a trinca-las e matar saudades do travo ácido que então nos acompanhava a
caminho das aulas no velho liceu de Vila Viçosa.
Às
vezes estamos mentalmente perante uma folha branca que espera as palavras
nascidas do impulso de falar de amor, mas falta-nos aquela primeira que dá o
mote e desbloqueia a poesia.
Chega
então uma florista com papéis que publicitam a sua arte, e acabamos todos a
falar de tulipas vermelhas e da forma como elas expressam a paixão.
E
a tulipa dá-me o mote para o poema que escrevo ainda mentalmente enquanto a
vendedora de flores se junta e toma um copo connosco na mesa confortável da “área
de serviço” onde estamos à conversa.
Depois,
dali até à portagem, o caminho goza de um infinito adorno amarelo e eu só tenho
olhos para as Azedas.
Nem
me lembro que é inverno e as árvores estão despidas de folhas, quando passo a
portagem e dou por mim já estacionado no parque onde os sorrisos se soltam por
entre o amor maior.
O
sol entretanto já se pôs, a noite até está fria, mas eu não consigo calar o
sorriso… e as palavras saltam em catadupa para a folha que já esqueceu o que é
estar vazia.
A
portagem… é claro, foi aquele beijo furtivo dado no brevíssimo instante que
roubámos ao namoro intenso dos nossos olhares.
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