Choverão flores sobre nós nesses dias da primavera que esperamos
A
chuva miudinha da manhã de Lisboa molha-nos a todos com independência do
estatuto intelectual que assumamos ou nos atribuam; e como tudo o que existe tem
sempre um lado positivo, até mesmo o mais negativo, as filas de trânsito que ela
patrocina à entrada da cidade têm o condão de nos dar tempo suficiente para
desfrutarmos dos detalhes que de outra maneira iriamos ignorar.
Vejo
as árvores de Monsanto…
Estão
verdes no benefício das folhas que nunca as abandonam, e em algumas das outras,
aquelas que o inverno despiu, já floresceram pétalas entre o tom branco e o rosa,
detalhes que lhes dão um ar de festa e nos lembram a primavera.
O
mesmo tom rosa que brilha com o amarelo nas fachadas ainda mais viçosas depois
da chuva que enegreceu o tom dos telhados que as encimam.
Percorro
a cidade segundo a rota das obrigações, mas é impossível não desfrutar do que
vejo, da chuva, e recolher da manhã a poesia da mais intensa das devoções.
Lisboa
será sempre a minha cidade por ser a pátria mãe do meu amor.
Depois
de descer a Rua de São Bento, de espreitar a casa de Amália, dou comigo a
descer a Avenida D. Carlos I. Os jacarandás oferecem-me um tecto, por estes
dias verde, nas folhas que brotaram dos troncos negros que na primavera serão o
esqueleto e a fonte que sustentará a mais intensa explosão de lilás.
Choverão
flores sobre nós nesses dias da primavera que esperamos.
E
não tardo a chegar ao rio.
À
minha direita passa acelerado, o comboio, e à esquerda vejo gente que corre em
paralelo com as águas como num esforço último para impedir que elas se
entreguem ao mar.
O
Tejo que hoje está cinzento da cor da chuva.
E
antes de deixar Lisboa, despeço-me do tom garrido das fachadas das casas que
fazem a guarda de honra ao Mosteiro e a Belém.
A
chuva miudinha persiste sobre mim; não são lágrimas, não são tristes, são
beijos da cor do Tejo para que paremos um pouco o bulício da manhã e sintamos
que já não tarda a primavera.
Os
tais dias em que choverão flores na Lisboa que é a casa do meu... do nosso amor.
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