Os filhos que mataram a herança da mãe madrugada
Por
muito que as flores insistam em perfumar os campos, que as andorinhas regressem
para povoar os beirais ou o sol se imponha ao rigor gelado do inverno, as
primaveras nunca serão todas iguais.
Somos
nós Homens os verdadeiros artífices da primavera, povoando as manhãs de Março…
e de Abril, de Maio… com a esperança que sempre encerra em si a liberdade.
Por
muito que se chame à liça o acaso e o destino, é o Homem que define e molda um
tempo novo por onde o futuro se sente melhor.
No
meu país há gente a esgravatar pão no lixo para trincar ao relento entre o
ténue conforto de papelões; na minha cidade, a modernidade pedida ao traço de
Calatrava, virou casa e dormitório formal com lotação esgotada para quem não
tem outro abrigo; os velhos morrem como antes, os jovens partem também como
antes…
Mas
o cofre do Estado parece que está cheio… também como antes.
Porque
definitivamente o Estado deixou de ser aquilo que é, o povo, para voltar a ser uma
elite, por ora muito tosca e bacoca
Os
“filhos da madrugada”, aqueles, os “Chicos” e espertos, enfiaram no dedo os “cachuchos”
comprados à pressa e com os quais disfarçaram a sua incompetência e tomaram o
poder, matando a herança da sua mãe, a liberdade.
Porque
um povo sem pão, sem tecto e sem futuro será sempre um povo amordaçado.
Cigarras
sem escrúpulos no seu canto eterno alimentado pela escravidão das formigas nos
carreiros apontados como inevitáveis, estes “filhos da madrugada” até poderiam
ser chamados de “filhos de uma senhora de moral duvidosa e que vende o corpo”,
se nós não soubéssemos que vieram como nós do berço de uma madrugada de primavera
e de liberdade.
Venderam
os quinhões da herança, as relíquias do palacete que ficou como fachada
portadora de janelas por onde nos acenam a nós, filhos da mesma mãe, a
madrugada, e formigas cansadas do seu canto de cigarra e tanto de cisne.
Talvez
haja ainda poucas prisões para tanta mediocridade que anda à solta; 44, outras
capicuas e todos os números… Encerrem-nos bem longe de nós para que por sobre o
seu choro sem escrúpulos, sem memória e mentiroso possamos acender cravos e
devolver a Março… e a Abril… as manhãs doces de primavera.
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