O inferno “d’antes” e de agora
Se
este país já vai sendo ele próprio um inferno, porque o que resta de paraíso
refere-se apenas à componente fiscal e destina-se a um grupo muito selecto e
altamente elitista, não é difícil escolher a que será a imagem mais infernal da
semana.
E
aí, imaginar a Margarida Rebelo Pinto e o Prof. César das Neves a brindarem com
Pepsi a uma mesa de um restaurante de bifes gerido pela Isabel Jonet,
estabelecimento dedicado a uma clientela de âmbito muito familiar e tendo como
relações públicas a Bárbara Guimarães, um espaço decorado ao jeito de marquise
com fotos de Passos, Portas, Cavaco e Maria, Seguro, Sócrates… num revisitar da
Família Adams, e onde os plasmas distribuídos pela sala vão transmitindo a Casa
dos Segredos e os programas da Cristina Ferreira, da Júlia Pineiro, do Jorge
Gabriel e do Nuno Eiró a apresentar o Leonel Nunes e o seu êxito “Porque não
tem talo o nabo?”… ganha a qualquer outro inferno que possamos imaginar.
E
o que restava de paraíso?
Os
anjos da guarda (assim como os da polícia) fizeram greve, manifestaram-se e
foram trepar a escadaria que dá acesso aos deuses instalados nos seus tronos,
ameaçando-lhes o conforto. Comprovou-se mais uma vez que só Jesus os consegue
pôr na ordem mas mesmo esse é só um, anda entretido com a “Champs” e até acabou
em tribunal e condenado a um mês de ausência da “catedral”.
Os
arcanjos celestiais, Miguel, Rafael e Gabriel, renderam-se e tomaram todos, o
apelido “Carreira”, pelo que as aleluias e os glórias foram todos trocados por
ritmadas baladas de fazer chorar as pedras da calçada e fazer enlouquecer as “Marias”
todas da terra, virando as peregrinações mais para os Coliseus ou para o
Pavilhão Atlântico do que para qualquer santuário nacional de maior ou menor
relevo.
O
purgatório, que ainda permitia alguma esperança de paraíso após alguns anos de subsídios
de Natal e Férias, foi desmantelado por recomendação do Memorandum de
Entendimento com a Troika e substituído directamente pelo inferno, com o objectivo
de equilibrar as contas públicas.
Em
auto de fé onde se esturricaram os professores em processos sem culpa formada,
os “doutores da lei” aproveitam o fogo e “mataram” juízes na praça pública, e o
juízo final (do orçamento e não só) é agora assegurado pelos financeiros que a
todos aplicam a pena máxima do sofrimento e da escassez, condenando-nos ao “aguenta,
aguenta”.
Milagres?
Já não há, à excepção da raspadinha, do Euromilhões ou das chamadas de valor
acrescentado que as televisões convidam a fazer directamente para os seus
cofres.
Santos?
Continuam por cá mas agora sobretudo os membros do ramo Angolano da família e
muito mais entretidos a comprar empresas e lojas de luxo na Avenida da
Liberdade, do que a fazer qualquer outra coisa em prol do desenvolvimento do
povo.
Velas?
Continuamos a usá-las mas cada vez menos nos altares pois acabam por nos fazer muito
mais falta em casa para nos oferecer alguma claridade quando os Chineses da EDP
nos mandam cortar a electricidade por falta de pagamento.
E
neste deserto (de ideias e de esperança), com o povo em fuga e sem que qualquer
“mar” (vermelho ou de qualquer outra cor) se abra para nos deixar passar, não
admira que um homem de trinta anos que marque três golos num jogo de futebol
seja convertido numa estátua dourada, o “bezerro de ouro” do século XXI.
No fundo, aquilo que nos faz falta, mesmo, e aquilo que realmente pode
fazer a diferença a nosso favor, é um Moisés que desça do monte com as tábuas
da lei (não confundir com os decretos assinados por mentecaptos) e nos conduza
até à terra prometida fazendo-nos esquecer os tempos de escravidão da Alemanha,
perdão, do Egipto.
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