Um velho marinheiro e o Duende na Ilha dos Poetas



Um velho pirata, marinheiro cúmplice dos cabos e promontórios, de todas as esquinas secretas ou mais ou menos discretas dos sete mares, navegava um dia ao sabor do vento, quando lhe apareceu lá ao fundo e mais ou menos envolto pelas nuvens, a montanha acendida por um enorme vulcão.
Será o fim do mundo?
Acelerou a embarcação e chegou cansado a uma praia deserta mas de areia fina temperada de muitas conchas.
Procurou uma fonte onde bebeu água, acendeu uma fogueira, retirou do barco uma mochila e uma esteira, e já se preparava para dormir quando ouviu passos. Primeiro ao longe, depois mais perto, passos pequenos, mas de gente por certo.
Eis então que de repente, por mérito da fogueira e do seu clarão, viu surgir um ser pequeno e a sorrir que lhe disse de pronto:
- Não te assustes velho marinheiro, eu sou um Duende, um dos muitos que há por aqui pela Ilha dos Poetas.
Eu levantei-me para lhe estender a mão, mas ele estendeu-a primeiro, e depois do cumprimento sentámo-nos por ali os dois a conversar.
- Sabes meu querido Duende, talvez eu vá ficar por aqui uns tempos a descansar. Estou velho e algo acabado.
- Velho não estás, talvez estejas só um pouco cansado…
- Sim.
- Então chegaste ao lugar certo. Amanhã subimos os dois por um caminho secreto e mostro-te uma casa a meia montanha, algures entre o mar e o fogo.
E concluiu.
- Vais gostar de lá morar. Não te esqueças que há sempre uma ilha que espera por nós quando nos sentimos a naufragar.
Foi então que no dia seguinte e à hora devidamente combinada o Duende apareceu e mostrou o caminho ao velho que subiu até à casa de madeira mais bonita que ele alguma vez tinha visto.
E pelo caminho ainda lhe disse mais ou menos isto:
- Ali naquele teu recanto feliz chegará também em breve quem te faça sentir a alma e o coração como que em paixão imersos, uma fonte de palavras e dos mais doces versos.
Ao chegar, o velho instalou-se logo por lá, abriu as janelas, cozinhou um almoço, e depois sentou-se na soleira a ver ao longe o mar, e a escrever.
As palavras sobre um papel amarrotado, que alguém um dia poderá ler, são as memórias de um velho pirata a descansar.
O irrequieto Duende todos os dias aparece com o seu irmão na velha casa de madeira, tomam um chá a meio da brincadeira, e ficam por ali às vezes a ouvir as velhas histórias e as lendas que guarda em si aquele velho que nunca se cansou de navegar.

O meu sobrinho João faz hoje dez anos, o que significa que há uma década me ofereceu este privilégio de ser tio, bênção reforçada pouco depois com a chegada do Luís.
Desculpar-me-ão pelo facto de eu dizer que são os dois meninos mais bonitos do mundo, mágicos e duendes inspiradores na vida de uma “velho” pirata de barbas já brancas, um eterno apaixonado que gosta de escrever a olhar o mar.
Um velho… eu, claro; quem mais haveria de ser?

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