Mensagens

A mostrar mensagens de novembro, 2017

A árvore que namora com a serra

Imagem
Na auto-estrada um, no sentido Lisboa Porto, do lado esquerdo e quase a chegar ao nó de Torres Novas, há uma árvore “empoleirada” no cimo de um pequeno monte, que há anos namora com a Serra D’Aire e Candeeiros, ali mesmo em frente. Sempre que a primavera escreve versos de urze e giesta, pela encosta acima, ela responde ao cortejar da serra, cobrindo de verde a sua paixão. Chorará depois, bem mais tarde, e folha a folha, quando Dezembro lhe desmanchar definitivamente a esperança de que seria este o ano que lhes “mataria” a distância. Gosto de entender a linguagem das árvores, sentir o seu abraço distendido e honesto às horas que passam, e prometi a mim mesmo que um dia escreveria sobre este amor tão grande, mas tão impossível quanto o do sol pelo luar, ou o do norte pelo sul no contexto de uma qualquer hipotética, mas irresistível, atração polar. Mas talvez um dia o vento sopre de um modo tão forte, que a árvore e a raiz possam voar finalmente sobre a auto-estrada, entregando-se

Paralelos ao sol

Imagem
Quando caminhamos paralelos ao sol descobrimos infinitas linhas informais que alinham os nossos passos com a melhor “caligrafia” do sonho e da vontade. Nus, sem roupas, compromissos ou cintos que nos “atem”, somos apenas nós e a nossa história. Tempero a manhã fria com o aroma do café que pinga, paciente, desde o filtro de papel e a cafeteira de vidro. Para lá da janela, o vento vai, aos poucos, roubado o ouro que o Outono ofereceu a um velho plátano, enquanto o Atlântico se mantém convictamente azul entre a curva da Caparica e o Cabo Espichel. Calei a rádio. Já não tolero o relato dos banquetes dos poderosos sobre a dolorosa e jazente morbidez da gente, famosa ou não, já sepultada ou em vias de o ser. A mediocridade dos intérpretes não acompanha a elevada expectativa dos entusiastas e cegos militantes das ideologias, e eu sinto desprezo pela patética figura destes últimos na hora de defenderem os dejetos, reconhecendo-lhes um “indiscutível” valor, aproveitando para, de cami

Gosto muito quando a noite põe um vestido encarnado

Imagem
Gosto muito quando a noite põe um vestido encarnado… Nas estradas de pó do deserto de areia, ou nas praças também desertas das cidades a que a hora roubou a gente, erguem-se imponentes pirâmides de luz com vértice de encontro ao céu estrelado, escadas informais por onde sobe o olhar e o sonho, sepultadas, definitivamente, as dores e o cansaço. Não importa nunca o nome das estradas, das ruas ou dos rios… Tejo, Nilo ou Sena, são irrelevantes detalhes das águas que correm soltas, sem cessar, cumprindo-nos a vontade e levando sem retorno, as mágoas, como quem devolve o sal ao mar. Na esquina de cada segundo desses ocasos rubros tingidos pela paixão, eu construirei um palácio de pedra, gigantesco, como quem eleva aos altares as coordenadas do destino traçadas sobre o mais improvável chão. Gosto muito quando a noite põe um vestido encarnado… Para comprovar esta agonia dos impossíveis, se acaso mais alguma prova fosse precisa, sempre te direi que um abraço teu consegue até

Vítor

Imagem
Debruçadas nos parapeitos das varandas rasgadas sobre a ousadia, as palavras dos poetas, íntimas dos cravos e das sardinheiras, esperam, incessantes, por uma voz que as beije e as faça voar com os pássaros, dobrando sem medos, as esquinas de todas as ruas. Talvez a voz se aproxime quando a guitarra já tiver acordado o coração, e a saudade, irrequieta, já nos tiver salgado o rosto, colando-nos à pele a fome dos abraços, bem mais dolorosa que a sua homónima relativa ao pão. Quantas palavras de tantos poetas correrão então pela cidade, e quantos rostos, corpos, trejeitos, quanto choro, riso, quantas gargalhadas, o gesto igual, normal, anormal, diferente… tudo espreitará no palco, que é o que mais se assemelha a uma rua, por poder ser a casa de toda a gente. Vítor é a arte que resgata do silêncio as palavras dos poetas, e é a poesia toda: dita, respirada, soletrada, mastigada, deglutida, incontida, de corpo inteiro e despida de medo e preconceito. Como o eco doce que nasce de