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A mostrar mensagens de junho, 2011

Museu do Côa

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Só as oliveiras e as amendoeiras, que insistem em entrecortar a verde o imenso mar de bege e castanho que parece irradiar fogo neste dia de canícula, nos acompanham pela estrada fora quando procuramos que cada curva nos revele a anunciada grandiosidade do museu. Não fossem as placas de estacionamento e jamais julgaríamos ter chegado. Está desde logo conseguido o primeiro dos critérios para ser grande: ser simples. Umas escadas íngremes convidam-nos a ir fundo numa gigantesca estrutura de linhas direitas que sendo enorme é igual a tudo o que a rodeia, permitindo que só o rio no seu correr azul continue a ser o elemento que se destaca quando olhamos em redor. Segunda virtude: discrição. E depois, percorrendo as sucessivas salas imensas pintadas de negro, entramos na vertigem do tempo para chegarmos às linhas que marcaram a pedra do paleolítico até hoje. Não sabemos se o que é actualmente oferecido aos nossos olhos foi em outro tempo comunicação, arte, entretém ou religião. Pode at

Lisboa eterna

O calor de um domingo de verão põe os carros em fila compacta para a margem sul, e eu fico com o Viaduto Duarte Pacheco livre e por minha conta para mergulhar em Lisboa. Passo pelas Amoreiras e espreito Campo de Ourique, desço ao Rato, faço a Politécnica, atravesso o Príncipe Real, sempre e só ao meu ritmo e ao ritmo dos semáforos, porque na cidade assim tão vazia não há nada mais que me detenha ou me faça avançar mais velozmente. Desço a Misericórdia e antes de virar à direita para o Camões, espreito a Rua do Alecrim com o Pórtico da Lisnave ao fundo e o Tejo de permeio num azul fortalecido pela luz do meio-dia. Quem um dia se sentir triste venha aqui e saboreie esta vista, garanto-vos que não há melhor “doping” para a alma. Deixo o carro, desço o Chiado e vejo Lisboa entregue a grupos de turistas altos, louros, inicialmente brancos mas já convertidos a cor de lagosta pelos efeitos do nosso sol, todos de mapa e guias na mão como que competindo numa grande caça ao tesouro. A Brasi

O primeiro Governo da minha geração

Quando o novo governo tomar posse na próxima terça-feira, a média etária dos seus ministros cifrar-se-á nos 47 anos, apenas mais dois do que os meus quase 45. Sinto pela primeira vez e de forma clara, que a minha geração chegou ao poder em Portugal, e, confesso-vos, tenho esperança que possa ser ela o motor que puxe o país para a frente, retirando-o da enorme crise, política, social e sobretudo financeira em que se encontra. Não alimento esta esperança por mera solidariedade e filiação geracional, faço-o sobretudo com base do reconhecimento do tempo maior em que tivemos o privilégio de crescer e fazer-nos Homens. À geração anterior à nossa devemos a gratidão eterna da conquista da liberdade que nos permitiu viver a segunda década das nossas vidas, os nossos tempos de liceu e entrada nas universidades, sem tabus, com visões alargadas, sem medos de pensar e agir diferente. Aprendemos línguas, começámos a viajar mais, vimos filmes e lemos os livros sem os cortes da censura, exercitámos

Nada acontece por acaso

Num curso de formação de magistrados a decorrer no Centro de Estudos Judiciários, todos os 137 alunos matriculados foram apanhados a copiar num exame. Nesta situação em que seria “justo” e razoável a anulação do teste e a realização de um outro, a direcção do Centro resolveu atribuir a todos a nota de dez valores, afirmando não encontrar uma segunda data para que essa repetição ocorresse. Numa instituição em que são formados agentes da justiça, a desonestidade é premiada com nota positiva, embora no seu limite inferior. Excelente treino para o futuro no exercício da profissão. Se os cábulas continuassem ainda hoje a ser brindados com um zero e com a anulação das suas provas, talvez aprendessem mais facilmente a distinguir o bem do mal e a separar o que está certo do que está errado, contribuindo dessa forma para um mundo onde imperassem valores como a honestidade, a justiça e a verdade, em suma tudo aquilo que constitui a grandeza e a nobreza de carácter. E neste caso talvez ganha

Morte em directo

Um multimilionário Inglês, vítima de uma doença neurológica que lhe comprometia os movimentos, recorreu aos serviços de uma clínica Suiça, pelos vistos já muito famosa, que o assistiu num suicídio gravado e transmitido em documentário pela BBC no inicio desta semana. Nesta história polémica e com contornos macabros há desde logo dois pensamentos que me assolam ao espírito: a legalidade / legitimidade da morte assistida e o papel dos meios de comunicação no contexto actual deste nosso mundo. Relativamente ao primeiro, considero-o uma questão muito sensível, para a qual as respostas se atolam sempre nos terrenos movediços da legitimidade ou não para decidirmos sobre o fim da nossa própria vida ou então sobre a vida de outrem. Mesmo admitindo que a vivência de diferentes contextos nos podem fazer mudar de ideias, confesso-vos que sou convictamente contra a eutanásia e qualquer forma de legalização da morte medicamente assistida. Identificar um conjunto de pressupostos a preencher pelo

Viva o Santo António

Com manjerico e balão Santo António vou festejar Dizendo às tristezas que não E mandando a crise marchar. Uma sardinha assada em Alfama, Num pão bem quente a pingar Dá-nos força e activa a chama Na hora da Troika enfrentar. Santo António presta atenção Que esta gente não é para brincar E não deixa qualquer tostão Sem IVA ter de pagar. O nosso povo já escolheu E optou pela mudança, O incrível Zé perdeu E vai estudar para França. Os Passos estão bem ensaiados E as Portas abertas para entrar Será que estamos tramados, Ou a boda nos vai salvar? Façam o que têm de fazer Nunca faltando à verdade Sabendo que o que importa é ter Paz, amor e liberdade.

Viagem ao interior da Terra ou… a outra face do Ouro Branco

Na revista “Notícias Sábado” que acompanhou o “Diário de Notícias” de ontem, vem publicada uma muito interessante reportagem, denominada “A Pedreira”, que mais não é do que um relato de uma visita às pedreiras de mármore de Vila Viçosa. São histórias contadas por palavras e imagens que carregam a verdade que nós Calipolenses conhecemos melhor do que ninguém, de como é duro o dia-a-dia no interior da terra em busca da valiosa pedra, há muito apelidada de Ouro Branco. Quando se contar a história de Vila Viçosa nas últimas décadas do século XX, teremos de colocar o mármore no centro da nossa narrativa, tal a influência que as actividades associadas à sua extracção e transformação tiveram na nossa terra, substituindo a agricultura que até aí ocupava um claro lugar de destaque. Desde logo, mudou a paisagem, e se antes chegávamos a Vila Viçosa por estradas ladeadas por alvos muros caiados que delimitavam olivais e quintas, hoje, se chegarmos de Borba, Bencatel ou do Alandroal, verificamos

PORTUGAL

Tornámos nosso o sonho do Rei Afonso e em cruzadas de coragem, muito querer e fé, unimos norte e sul, dando espaço à identidade e ao ser, nascidos das cumplicidades da alma desta gente brava que habita o cais onde a Europa se entrega ao imenso mar Atlântico. Com o sangue nascido de uma esperança restaurada em cada dia, bordámos as fronteiras que deram e dão forma ao sonho. Preenchemos as serranias, os pinhais, as planícies e as longas praias com a forma tão nossa de ser simples, vestimo-nos com sete saias, capotes ou varinos, e nos dias que quisemos tornar maiores, criámos romarias bailadas a malhões, viras, chulas ou corridinhos, entoadas a fados, desgarradas e canto chão, saboreadas a caldo verde, chanfana, alheiras, bacalhau e açordas, e regadas com o vinho que não importa de onde é, porque sendo nosso é melhor que qualquer outro. Mas por querermos sempre ser mais e ir mais longe, ousámos sair pelo mar fora, tornando pequenos os Adamastores e Mostrengos dos medos dos Homens, pela

Passos & Portas, Lda - Uma aventura no país da Troika

Cerca de 60% dos eleitores votaram hoje e promoveram a mudança de governo em Portugal. Do dia e da noite, registo: PASSOS – É o vencedor. O intérprete mais improvável concretiza 31 anos depois da morte de Sá Carneiro, o seu desejo de um governo, uma maioria e um presidente. Não tem o poder absoluto mas parte para a negociação com Portas com o conforto de um bom poder relativo. Parte com a vantagem de nunca ter dito que os próximos tempos seriam fáceis. SÓCRATES – O grande derrotado que apresentou a demissão de todos os cargos no PS. Disse adeus com o suporte do seu inseparável teleponto num discurso a apelar ao sentimento e em que pretendeu realçar o seu lado mais humano de pai e patriota. Cinismo até ao fim. Da plateia de militantes fez um biombo atrás do qual se escudou das questões mais polémicas dos jornalistas. Vergonhosa a forma como a plateia censurava com vaias as perguntas dos jornalistas, mas a demonstrar bem o que foi o respeito pela liberdade de expressão no país de Sócrate

Viagens

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Era uma manhã de Agosto de 1992 de um dia que já não recordo, e eu e o João Paulo acabávamos de chegar a Madrid depois de uma noite no comboio a percorrer a distância entre as duas capitais ibéricas. Com as malas às costas, calcorreámos as ruas à procura de um poiso limpo, seguro, central e sobretudo económico, tendo acabado os dois numa pensão a dois passos da Puerta del Sol, onde montámos o quartel-general para não deixar por ver nem um cantinho da capital castelhana. Nem o calor de Agosto, que sistematicamente nos empurrava para o ar condicionado do El Corte Inglês, nos impediu de “bater a cidade” de ponta a ponta, de museu a museu, de palácio a palácio, de igreja a igreja. Nos anos seguintes e depois de Madrid, aterrámos juntos, e pela primeira vez em ambas as vidas, em Londres, Edimburgo, Inverness, Barcelona, Montpelier, Avignon, Viena, Praga, Budapeste, Nova Iorque, e também nos Açores. Destas viagens trouxemos milhares de fotos, guardámos milhões de recordações e histórias, e n

O circo desceu à cidade

Arruadas, feiras, mercados, bandeiras, panfletos, cartazes, as histéricas do costume, bombos, bandas, aventais, jantares e almoços de carne assada, gritos, empurrões, ofensas, afonia, palcos, caravanas, megafones, beijos, abraços, apertos de mão, saudações às criancinhas, fábricas, padarias, escolas, lares de idosos, creches, futebolistas, cantores, paquistaneses, africanos, quilómetros, peixeiras, mulheres da fruta, cravos, rosas, declarações de amor, o verbo dizer sempre no passado, o verbo fazer nunca conjugado no futuro, acusações, casos, especulação, sondagens, jornalistas, microfones, câmaras, troika, FMI, dívida, demagogia, insinuações… Os políticos andam em tournée pelo país real, sem ideias, sem convicção, e sobretudo sem tempo para se aperceberem de como as pessoas a quem tentam caçar votos, gostariam de um dia poder voltar a acreditar no futuro. O exemplo, a honestidade e o empenho seriam o maior fermento para a nossa fé. Mas estamos tão longe…