“I have a dream”


O tempo não apaga o eco das palavras incandescentes, fogueiras acendidas pelo ímpeto de liberdade, que persistem, aqui, entre os ramos dos carvalhos e as farripas de sol, que os beijam em êxtase ao fim da tarde.
O sangue, rubro, desenha papoilas que nos afloram ao olhar, candeias em verso, velas que nos limpam os soluços da viagem e nos impedem de naufragar.
Os meninos, que vieram de perto ou de mais longe, e que trajam vestes coloridas sobre os seus corações sem cor, fizeram uma roda gigante onde as mãos e as vozes rimam com o futuro, e com o poema desenhado para uma eterna canção de amor.
Há beijos sentados nos bancos de madeira, detalhes de amores sem género, credo, rótulo, dinheiro ou distância, beijos sem aditivos ou corantes, e que a alma desenhou à sua maneira, como se mais nada tivesse importância.
O homem que salta à corda e a mulher que assobia, passeando-se de mãos nos bolsos por entre a gente, decalcam gestos sobre a verdade que trazem ao peito, esmagando pela igualdade, a repugnante dor de qualquer fobia.
Deus não mata, não condena, não cala, não separa... Qualquer que seja o detalhe sagrado ou religioso, a tefilá, o mantra, a salá ou o salmo que ouvi, Deus apenas sorri.
Derrubámos os muros, como se fossem folhas de papel fáceis de rasgar; substituímos o hidrogénio pelo sonho nas bombas certeiras que cruzam o mar; enchemos os mísseis de pão; pusemos açúcar sobre os caminhos, eliminando as fronteiras e o alcatrão; eliminámos as manchas negras das notícias, impregnando-as de poemas ditados pelo coração.
E voámos com os pássaros por sobre todas as noites, mesmo as mais escuras, juntando pedaços de estrelas e linhas de luar, sabendo que cada madrugada é uma chance única é imperdível para que o mundo se possa reinventar.
"I have a dream".
"Eu tenho um sonho"… que persiste com a força de acontecer.
Há sonhos assim, que não se nos podem morrer.

 
(Washington, 14 de Setembro de 2017, lembrando Martin Luther King e o seu “sonho” de 28 de Agosto de 1963)

 

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