“Tenho um Einstein lá em casa” e outros vícios privados e públicos...



Quando o sol se ergue a oriente despertando a lusa pátria, cedo se agita a expressão pública dos nossos vícios mais marcados, tão nossos que parecem genéticos.
No ano do meu cinquentenário irei partilhar convosco vários rankings, e começo com o Top 10 das coisas que mais me tiram do sério.
A ordem de apresentação não estabelece entre eles qualquer hierarquização.

A ESCADA ROLANTE
Subindo ou descendo, a grande maioria das pessoas pára no espaço imediatamente a seguir ao último degrau, indecisa se vai virar à esquerda ou à direita. Hesita...
E os que estão atrás?
É tão bonito ver cair uma estrutura de peças de dominó.

OS PIANISTAS
Na alma de cada Português brilha uma Maria João Pires e nos nossos dedos fervilha um Chopin. Mas como quase ninguém tem piano em casa, para onde é que vamos treinar?
Para as teclas do Multibanco.
Por cartão, põe código, pede extracto, tira cartão, põe outro, põe outro código, pede extracto, tira cartão, põe outro...
A fila atrás vai crescendo e até há gente a soprar, mas quem toca piano olha de viés com ar de estrela:
- Eu nasci para ter aplausos no Grande Auditório da Gulbenkian. Não me cedem o palco e eu junto aqui o meu público.

A COISINHA PEQUENININHA
Sempre que há uma fila mais ou menos organizada, com ou sem senhas, há sempre alguém que se chega à frente para uma perguntinha ou qualquer outra coisinha.
Este sufixo "inho" é uma estratégia tipo 0,99€ nos preços dos supermercados, transmitindo que o tempo que vai tomar é desprezível.

A MANIF DA CGTP
Uma pessoa está sozinha e pretende jantar sossegada e em silêncio, pega na esferográfica e no bloco, espreita pela montra e vê que o restaurante está tranquilo e lhe oferece a possibilidade de escrever algo, e entra.
Cinco minutos depois começamos a ouvir os dois funcionários em conversa:
- Eu já lhe disse que não faço nem mais um minuto.
- Faça-as ele.
- Isto tem sido um horror...
- Oh filha parece que anda tudo com fome e não nos desamparam a loja...
Eu disse escrever?
Só se for no livro de reclamações.

O IMPRESSO 5437/67 B
Numa qualquer repartição, publica ou não, o nosso interlocutor atrás do guichet adora perguntar coisas difíceis mas sempre depois da frase "isso não é comigo".
- O senhor vai ter que ir à minha colega que está no terceiro piso, compra o impresso 5437/67, mas o B, que é amarelo...
- Mas no terceiro piso, onde?
- Pergunta ao segurança e tira a senha azul... PRÓOOOOXIMO

DO MAL O... MÁXIMO
Nós os Portugueses somos dos poucos povos do mundo que competimos pela maior desgraça.
- A minha filha foi operada ao apêndice na semana passada e a coisa esteve mal.
- Ui, tu nem imaginas, a minha filha quando teve a apendicite até já tinha hálito a pus.
- Mas olha que o médico disse-me que se eu tardasse umas três horas que já não haveria nada a fazer.
- Três horas? O médico da minha filha falou-me em trinta minutos.

MUITO RISO... POUCO SISO
Eu sou uma das maiores vítimas deste principio, e só porque adoro rir.
É que para além de não me levarem a sério em muitas situações onde impera um ar grave de velório e sacristia, ainda nos deixam órfãos em caso de algum problema ou dificuldade.
- Tu? Problema? Cala-te lá que tu estás sempre bem disposto.

EU AGORA NÃO POSSO ATENDER
Em sítios públicos há sempre um telemóvel que toca de forma estridente.
Quando toca na mala de uma senhora e a situação em que estamos até não é muito interessante, ainda nos distraímos com o som que vai aumentado:
- Ela está quase lá.
Mas mesmo bom é quando atendem e dizem num tom sussurrado mas que todos ouvimos:
- Agora não posso atender. Estou no cinema.

TENHO UM EINSTEIN LÁ EM CASA
Qualquer sala de espera é uma arena para esgrimir forças relativamente à inteligência dos filhos e netos:
- O meu neto até já faz contas com os números de cabeça para baixo.

ÀS APALPADELAS
Juro que não entendo porque é que atribuímos aos Espanhóis o vício de mexer em tudo.
Já foram a um hipermercado?
Ninguém consegue ver pela cor de o pão está bem ou mal cozido, e então vamos esborralhando as carcaças com o mesmo prazer como esvaziamos aquelas bolhas do plástico que protege o conteúdo de algumas embalagens.
E a fruta?

Haverá mais situações...
Até breve com outro ranking para celebrar o meu jubileu.
Celebrar a rir, claro.


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