Roteiro para uma Páscoa em casa | Domingo de ramos



O antídoto do confinamento é a criatividade, e se hoje não podemos subir a Jerusalém com palmas, alecrim e ramos de oliveira, celebrando a entrada triunfal de Cristo, desatemos essa festa na imaginação e na intimidade da sala de estar, por estes dias já com estatuto de avião com janelas para o universo inteiro.
Fui buscar uma foto da muralha e porta da cidade santa que foi essencial ao domingo de ramos. Tirei-a em julho passado, enquanto repousava um pouco à sombra do jardim das oliveiras.
Partilho-a convosco, chamando a atenção para o facto dos túmulos que estão na sua base serem os mais caros do mundo, ao jeito de executiva do descanso eterno. Tudo porque se acredita que Deus virá um dia, ressuscitará os mortos para entrar com eles em Jerusalém, exatamente por ali, havendo quem não queira atrasar-se.
E os ramos?
Sempre poderemos cantá-los, como aqui, com a ajuda preciosa da Teresa Silva Carvalho:


Mas os ramos também poderão ser diferentes dos habituais.
Estou seguro de que nos vasos existentes em vossas casas terão flores ou folhas verdes que poderão acompanhar-vos nesta Páscoa, e sem que sintam a falta da água benta, porque o olhar de um coração que crê será tão ou mais eficaz do que o divino líquido no infinito derramar de bênçãos.
Os nossos olhares.
E se no decorrer do rito nos apraz rezar, olhando a terra e as flores, façamo-lo pelas palavras de quem percebe da alma, Sophia de Mello Breyner:

“Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos
A paz sem vencedor e sem vencidos
Que o tempo que nos deste seja um novo
Recomeço de esperança e de justiça.
Dai-nos Senhor a paz que vos pedimos
A paz sem vencedor e sem vencidos

Erguei o nosso ser à transparência
Para podermos ler melhor a vida
Para entendermos vosso mandamento
Para que venha a nós o vosso reino
Dai-nos
A paz sem vencedor e sem vencidos

Fazei Senhor que a paz seja de todos
Dai-nos a paz que nasce da verdade
Dai-nos a paz que nasce da justiça
Dai-nos a paz chamada liberdade
Dai-nos Senhor paz que vos pedimos
A paz sem vencedor e sem vencidos”
In Dual (1972)



Todos os que atravessámos os anos setenta do Século XX trazemos connosco a carga pop do Jesus Christ Superstar, e por isso que tal voarmos até Londres e passarmos pelo West End para desfrutarmos deste “Hosanna”, podendo até desfrutar da totalidade do filme:



Não será propriamente muito pascal, mas para que a viagem se sinta mais real, uma cerveja tomada ao jeito de um pub, antes de desfrutar do musical, pode dar alguma ajuda.
Para terminar, não havendo ramos, procissões, Jerusalém, água benta, salmos… sempre podemos socorrer-nos de uma cadeira (firme) da sala para celebrarmos Cristo, o nosso Capitão, por entre a busca de um poema perfeito.
Porque os nossos gestos são os melhores substitutos das flores.



Um forte abraço e até amanhã, porque a Páscoa só agora começou.


Comentários

Mensagens populares deste blogue

O MUNDO MAIS BONITO E CONFORTÁVEL NUM TEMPO A CHEIRAR A FLORES

“Quando mal, nunca pior” ou a inexplicável rendição à mediocridade

TESTAMENTO DE UM ANO COMUM