Casas surreais

O colorido das capas das revistas acaba sempre por chamar a minha atenção quando me dirijo à banca para comprar os meus jornais de fim-de-semana.
Hoje não foi exceção e apercebo-me que sem que eu tivesse dado conta do aparecimento ou meteórica ascensão, a pessoa mais importante por estes dias em Portugal é um tal de João M, M ao que parece de Mota.
As revistas destacam os locais que visitou, quem o acompanhou, o que comeu, bebeu e fez, um individuo cujo único “mérito” foi ter ganho o programa “Casa dos Segredos”, uma espécie de “Big Brother” de terceira geração, afinado à mais avançada e requintada mediocridade.
Ele domina e só não tem o pleno porque há princesas e infantas que sofrem porque os seus eleitos as traíram ou se apoderaram de bens de uma forma ilícita.
Sabendo-se que as revistas se limitam a publicar o que os compradores e os leitores gostam de ler, é fácil concluir que a maioria da nossa gente cresceu em altura, retirou as fraldas, a chucha, aprendeu a comer sozinho, mas jamais se desligou da leitura viciante das histórias da Bela Adormecida ou da Gata Borralheira.
Nos países com regime monárquico, o rol de príncipes, princesas, duques, duquesas e afins, fornecem histórias em número suficiente, histórias que no meu caso, confesso-vos, servem apenas para reforçar o meu total republicanismo e o meu asco pelo exercício do poder por pessoas não eleitas, para além do meu repúdio pelo estabelecimento de uma hierarquia social estabelecida por sangue ou matrimónio.
Em Portugal como não temos reis e príncipes, fabricamos as histórias em laboratório, colocando os sem escrúpulos e sedentos de fama, no interior de casas fechadas mas com janelas para o mundo, durante meses, construindo heróis a partir da mais elementar vulgaridade.
E envolvidos por estas Casas Reais ou dos Segredos, mas sempre Casas Surreais, continuamos a esquecer-nos de que são os valores do ser que fazem as boas pessoas e dão a marca de heroicidade ao carácter.
No passado dia 8 de Dezembro quando estava a participar na Eucaristia da Imaculada no Santuário de Vila Viçosa, reparei que o sacerdote ao iniciar a homilia se dirigiu em primeiro lugar a suas altezas reais, os Duques de Bragança, presentes na igreja e sentados em local de destaque.
Acho inacreditável como na Casa de Deus, ao celebrar a Morte e Ressurreição de Cristo, o maior lutador pela justiça e pela destruição dos poderes feitos e estabelecidos pelos Homens, se realcem estes poderes terrenos e muito pouco divinos.
Ou então serei eu que devido aos meus parcos conhecimentos de teologia, faço uma interpretação incorreta dos evangelhos?
Talvez, mas não me parece.

Comentários

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Como os meus conhecimentos em teologia são um pouco menos parcos que os teus, por questões de formação, posso então admitir que esse é um dos motivos que me leva para mais ou menos longe no dia de tão grande festa em V. Viçosa! Não aguento esse tipo de situações!
    O outro motivo é também de ordem teológica, mas esse fica para outro dia!

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  3. Óh, mas a festa vai acabar? Eu que gostava tanto de ver os cavalinhos montados nos princepes, e as carroças a serem puxadas por suas altezas (não sei de quê). Bolas! Não acabem com o circo por favor senão as pessoas não têm onde se divertir... :-(

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