No Alentejo...



No Alentejo as mãos não desistem e revolvem e acordam a terra adormecida no longo estio a que a sede oferece sabor de infinito.
Ficamos com o ouro colado ao peito pelas searas maduras do trigo que colhemos ou então pelo fio que escorre do despertar da geada nos olivos entregues às manhãs de inverno.
No Alentejo... Vivemos e cantamos sobre todas as dores porque nos matamos a trabalhar.
E nunca cantamos ou estamos sós, cantamos de braço de dado com os amigos na dolência que aprendemos com o sol, que nunca corre.
À lareira no inverno gelado, buscando aquela nesga de sol que irrompe por Dezembro, ou então tentando agarrar alguma brisa fresca nas noites de verão em que não se fecha a porta; estamos sempre juntos à conversa e matamo-nos a rir, de nós, porque vivemos bem com tudo aquilo que somos, e às vezes até rimos da má sorte que derrotamos com as mãos e com esta forma de ser feliz.
As mulheres que louvam o Céu na genuflexão sobre a água fria dos ribeiros ou na carícia das ervas a quem pedem aroma para os almoços de pão, carregam a dignidade de quem luta com a alma toda. E há sempre uma força à espreita para agarrar o "caco" da cal e oferecer às casas a alvura que não se vê em mais nenhum sítio de Portugal.
Os horizontes são longos, os dias sem pão e sem afectos são ainda maiores, os montes são casas perdidas no meio de onde mais nenhuma alma espreita... e às vezes acreditamos que o mundo acabou e deixamo-nos levar pelo silêncio e pelo choro que os olhos não deixam ver.
Mas deixamos sempre alguém que chora por nós nos recantos brancos de mármore onde o corpo se rende à terra por entre o dolente tom dos sinos.
No Alentejo a alma sabe gritar e sabe dizer não à injustiça. Desde as terras de Grândola a Baleizão, nós somos lume aceso e somos o povo que assume o gesto e o querer de quem não desiste e reinventa as madrugadas com uma revolução.
Alentejo...
O paraíso não é de quem o quer mas de quem tem alma para o entender, e a luz não é de quem a procura, é de quem tem “olhos” para a poder ver.

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