A terapia do Feijão com Mogango e das Migas de Tomate

Por estes dias de entre Natal e Ano Novo, o Alentejo cumpre esta contradição que é parte da sua magia, de um sol fantástico e de um frio que enregela até as partes mais recônditas do esqueleto.
Não me importo mesmo nada com isso. Se não fosse assim não era verdadeiramente Alentejo, não seria Vila Viçosa e eu jamais me sentiria em casa como agora me sinto.
Quanto mais mundo conheço, mais reforço a convicção de pertencer a esta terra e de ser este verdadeiramente o meu espaço.
Aconchegado de dia pela braseira que se encontra debaixo da minha camilha e de noite pelas pesadas mantas coloridas de Reguengos, faço por estes dias o meu atestar de paz, tranquilidade, amizade e força para enfrentar mais um ano.
Não sei se por andar a fugir à televisão e à rádio, ou se por ainda não ter comprado sequer um jornal, numa assumida atitude quase monástica de um Cartuxo, mas até parece que já estou mais optimista quanto a 2012.
O pior será quando eu acordar do sonho com o despertador da Troika a tocar. Mas isso a seu tempo se verá e tratará.
Quem me conhece bem, sabe que jamais coloco o estômago fora de qualquer festa, e o “retiro” destes dias não poderia ser excepção. Ao ritmo da saudade e com a ajuda das artes culinárias da minha mãe, comprometida que parece estar em dar-me tudo o que de melhor sabe fazer, já me deliciei com Feijão com Mogango (abóbora, para quem não domine “Alentejanês”), Migas de Tomate, Sopas de Hortelã, Carne do Alguidar, etc.
Por ser Natal, o combate à minha diabetes fez também uma abençoada trégua e até Sericá, Arroz Doce e Azevias de Grão, não se ficaram pelo armário e vieram também ao sacrifício anual no altar desta minha gula de marca Alentejana.
E a semana ainda não chegou a meio.
No outro dia, o meu sobrinho João, que do alto dos seus seis anos é um dos meus maiores inspiradores e um dos meus filósofos favoritos, chorou quando descobriu que jamais conseguiria saber contar até ao último dos números. Perturbou-o o facto de os números serem infinitos.
São infinitos os números e infinito é também o tempo, não o nosso tempo nem o tempo dos que gostamos, porque esse é limitado e por vezes nos parece tão escasso.
É curioso como a vida nos molda e transforma.
Primeiro choramos porque não conseguimos agarrar o mundo nas nossas mãos e mais tarde choramos porque o mundo que nos chega às mãos é afinal tão curto em relação ao muito e ao grande que ambicionámos que fosse.
Não me importo pelo facto da semana terminar daqui a alguns dias. Sei que matarei as saudades do futuro com a esperança de poder voltar sempre aqui onde sou mais eu e onde sou feliz.
Bendito seja este Alentejo que me aconchega o corpo e sobretudo a alma.

Comentários

  1. Bonita reflexão, como sempre! ;)
    Esta épocas é muito bonita, por muitas coisas, mas também pelos reencontros. Por estes dias, muitos calipolenses regressam, mesmo que seja por poucos dias. É sempre bom (re)ver velhos amigos que, como nós, estão literalmente mais velhos, mas podermos verificar que a amizade, esse grande valor, não ficou no passado.

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