O historiador, o amnésico e a culpa solteirona

Em Portugal, o desemprego atinge números elevados e nunca vistos anteriormente.
Por não terem emprego nem o vislumbrarem no futuro, só no primeiro trimestre deste ano, mais de cinquenta mil jovens abandonaram o país.
Por estas duas notícias me terem acompanhado hoje ao pequeno-almoço, permiti que o debate parlamentar de hoje sobre economia e emprego me entrasse pelo tempo de almoço, tendo-me dedicado a escutar a troca de argumentos entre o actual governo e a bancada da oposição composta por aqueles que há um ano eram governo.
O circo da miséria e da falta de vergonha e pudor.
O vazio de ideias que nos mata definitivamente o futuro.
Em Portugal, os políticos são actores que alternam ciclicamente entre dois papéis: o governo e a oposição.
São sempre os mesmos, só mudam os papéis e claro, o sítio onde se sentam no hemiciclo.
Ao vestirem a pele de governo, os políticos transformam-se em especialistas de história, invocando-a sem tréguas para explicar um presente que é sistematicamente visto como uma prenda envenenada recebida como herança dos antecessores.
Os actores da oposição cedo aprendem o seu novo papel, muito mais cómodo, diga-se, e de forma despudorada cobram e responsabilizam os do governo, esquecendo-se dos seus desempenhos passados.
E a culpa, a responsabilidade pelo que temos?
Fica solteira e órfã naquele vasto território que abarca o passado e o presente, e que por ser tão vasto, é terra de ninguém e onde tudo se dilui.
Não há responsabilidade e sobretudo não há ideias nem soluções.
Não há coragem nem acção para afrontar os problemas, colocando o cidadão e o bem comum acima de quaisquer interesses pessoais e de grupos.
Mais atentos, descobrimos que neste nosso teatro, dos actores, de uns e de outros, saem cordas que os transformam verdadeiramente em marionetas e que os seus movimentos e ritmos são ditados pelos interesses dos muito poucos que têm muito, dinheiro e poder. E até daqueles que lavam mais branco os estranhos capitais.
É tudo isto que nos esmaga, disto se faz a crise.
É disto que fugimos e é tudo isto que nos compromete definitivamente o futuro.

Comentários

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Neste momento já não existe democracia, porque já não existe ninguém a representar Portugal, nem o PR faz isso bem. Cada um que se senta na bancada parlamentar está lá a defender o que é seu, mas não é muito diferente do que se passa cá fora, é cada um por si, tornámo-nos num povo mesquinho, falso, grosseiro e capaz de matar o pai ou irmão por dinheiro. O que mais me chateia é que não os temos no sítio para mudar o curso das coisas, somos uns mansos, somos a esposa que é agredida violentamente pelo marido durante décadas e aceita a desgraça de bom grado. Continuo a dizer, que quando os pais começarem a enterrar os seus filhos porque não tinham pão para dar de comer, a realidade vai alterar, mas alterar de forma grotesca, e depois os mesmos que nos batem quando tiverem medo vão nos dizer que se decidirmos seguir pelo o caminho da força que esse é o lado errado da democracia. E se o meu país conseguir apenas sobreviver ao trazer sobre os que nos oprimem justiça feroz, eu mato não por vontade, mas por necessidade.

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