Na ponte sobre a auto-estrada…
Na ponte sobre a auto-estrada, um homem segura a
bicicleta enquanto olha para longe, para o sítio de onde eu venho. O sol
alinhou-se momentaneamente com os raios da roda traseira e ganhou o estatuto de
uma imensa laranja com gomos de luz.
Eu passo em direcção ao sul, rápido, e este instante
intercepciona a minha pressa com a tarde estirada e lenta de um
"velho" a quem pouco mais resta do que o horizonte para se entreter.
Cabe tudo no mesmo segundo.
Talvez o homem regresse agora do campo e traga
diospiros maduros no cesto de verga que vislumbrei atado à parte traseira do
veículo que usa como uma imensa bengala que desliza sobre as pontes e as
veredas.
Se o verão não tivesse acabado, jamais os nossos
passos se revestiriam de ouro neste caminhar sob os plátanos que Novembro vai
despindo lentamente.
Eu juro que um dia porei a pressa no bolso e olharei
contigo todos os horizontes que o ocaso pinta de vermelho por sobre o plúmbeo
tom das nuvens na premonição de chuva.
Os dois como um "velho" solitário numa ponte
da auto-estrada, algures por aí, enquanto os frutos do Outono se espreguiçam ao
sol.
Tudo se ajeita num mesmo instante e não existe um fim
que não seja simultaneamente um começo...
Basta que a vida se cruze com a liberdade que a
reinventa e a seduz, por entre as palavras de amor que ousamos ir inventando,
como gomos doces de uma laranja nascida em contra-luz.
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