Carnaval I


Não fosse a foto que aqui partilho convosco e nem eu teria memória de algum dia ter posado como pistoleiro, inspirado certamente na famosa série Bonanza, de enorme êxito na TV nos finais dos anos sessenta.
E logo eu, um pacifista assumido e ultra militante.
Mas o Carnaval sempre serviu para nos dar esta oportunidade de sermos por horas ou dias, aquilo que não somos na realidade. É a possibilidade de sermos actores sem palco, de assumir outra identidade sem que chamem de imediato o psiquiatra para nos fazer um diagnóstico sofisticado e trate do nosso internamento compulsivo.
Este pistoleiro foi obra dos meus pais, sempre com a minha colaboração, que nunca fui de virar a cara a uma festa ou actividade divertida.
E assim mascarado, não faltei à matiné da Sociedade Artística União Calipolense, que na tarde de segunda-feira de Carnaval sempre se enchia de famílias inteiras para dançar, atirar serpentinas e papelinhos, ao som do conjunto musical que pelas noites assegurava os bailes para adultos.
Os bailes eram os reis do Carnaval por terras de Vila Viçosa, existindo um calendário que assegurava a existência de um ou dois em cada um dos dias de Carnaval.
Todas as sociedades recreativas tinham os seus salões que decoravam a preceito, contratando conjuntos musicais para pôr os associados a bailar ao som das canções da moda e nesta altura, ao som das modinhas brasileiras.
Já referi a Sociedade Artística União Calipolense, mas também a Sociedade Filarmónica União Calipolense, o Calipolense Clube Desportivo de Vila Viçosa e os Bombeiros Voluntários de Vila Viçosa, tinham os seus bailes, pela tarde e pela noite.
Os bailes eram ao jeito da altura, com os homens de pé e encostados ao bar de mini na mão, as mulheres casadoiras em pose de ser convidadas para o baile, com as respectivas mães sentadas ao redor do salão na missão de controlar o maior ou menor aperto que os pares ofereciam aos corpos durante a dança.
A afluência de gente era proporcional à popularidade das associações, com os Bombeiros Voluntários no topo como sociedade mais concorrida e a Sociedade Artística como a mais selectiva.
Não me acusem de elitista mas eu preferia esta última porque tendo menos gente, oferecia mais espaço para a dança sem que constantemente fossemos pisados ou pisássemos o parceiro ou a parceira.
Os conjuntos que animavam os bailes eram compostos por cinco ou seis elementos, com guitarras eléctricas e acústicas, baixo, bateria, saxofone e um vocalista invariavelmente masculino.
Não me perdoaria se não vos falasse aqui daquela que era a banda mais famosa da nossa terra por estas alturas.
Chamava-se “Star Melodia”, e eram os verdadeiros Beatles Calipolenses, com um reportório variado onde o Roberto Carlos ou os “Shadows” tinham assento mais do que assegurado.
Eram omnipresentes em todas as festas e bailes e já todos lhes conhecíamos os tiques e as maneiras sobretudo quando após uma série de três ou quatro músicas diziam em tom dolente e sotaque alentejano:
- Podem “descansari”!
E bem mandados, lá íamos nós ver as estrelas, ainda embalados pelas memórias da melodia.

Comentários

  1. Vivam os bailes e os Star Melodia. Eram carnavais diferentes. Para nós, animadissimos!
    Tanta animação, que por vezes não sabia que musicas tocavam ou que as tocava... mas isso, são outros carnavais.

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