O Leão e a Estrela

Aos 90 anos de idade, partiu hoje Artur Agostinho.
Foi jornalista, actor, entrevistador, apresentador de televisão, foi, resumindo, um dos grandes comunicadores da segunda metade do século XX português.
Poderia ter sido o número elevado de vezes que o ouvimos e vimos, a justificar o facto de o considerarmos muito, quase como de família, mas estou certo de que o que alimentou esse sentimento foi a credibilidade e sobretudo a honestidade com que sempre encarou a sua vida profissional, manifestando um imenso respeito por todos nós, o seu público.
A espontaneidade que o marcava, era para mim a expressão de uma pessoa que vivia bem consigo própria.
A última vez que me recordo de o ver na televisão, foi na Gala Eusébio, uma festa com a marca do Benfica, destinada a comemorar os 50 anos da chegada do Pantera Negra ao Glorioso. Artur Agostinho, Leão de coração porque confesso sportinguista, deu a todos uma lição de fair play e provou que quando se é grande, fixamo-nos sempre no que é essencial, nos valores reais, colocando para um secundaríssimo plano os detalhes que nos tornam diferentes. A filiação clubística, por muito que a valorizemos, e eu também o faço, não é afinal assim tão importante no contexto da vida. Há valores bem maiores.
Estranha coincidência esta, da partida de um homem incontornável e exemplar no desporto em Portugal, num dia em que acordámos mais uma vez com a notícia de um ataque a dirigentes e jogadores do Benfica no norte do país. Com uma inaceitável tolerância das autoridades policiais e inspirados nos seus dirigentes desportivos, verdadeiros ícones da irracionalidade, há hoje grupos de indivíduos que tendo por pretexto a sua filiação clubística desprezam e põem em risco, a vida de outras pessoas só porque elas são de um clube rival.
Incompreensível.
Era bom e muito útil que a memória e o exemplo de Agostinho nos ajudasse a todos a ser diferentes, para melhor, claro.
Mas com a partida de Artur Agostinho desaparece também a última Estrela, o último dos grandes protagonistas da época de ouro do cinema português, um tempo que produziu comédias cujas falas e enredos sabemos de cor e que jamais nos cansaremos de ver e rever.
Recordo-me dele por exemplo no Leão da Estrela ao lado de António Silva, Laura Alves, Milú, Curado Ribeiro, e muitos outros mestres da gargalhada e do bem dispor.
Com muito respeito e saudade, aqui deixo então um adeus a Artur Agostinho.

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