O pecado do Entrudo


Eu, traidor das Finanças Públicas da nação Portuguesa me confesso: hoje, dia de Entrudo, não fui trabalhar.
E foi carregando a culpa, por via da consciência do impacto altamente negativo desta minha atitude sobre o Produto Interno Bruto, que me levantei e me dispus a enfrentar um dia que amanheceu demasiado cinzento.
Depois de ter dormido até mais tarde, num acto inaceitável de “rebeldia contributiva”, com um longo café na mão, ligo a televisão e apercebo-me de que todos os canais estão focados no Carnaval colocando imagens dos corsos que saíram e vão sair à rua por todo o país.
Salvo raríssimas excepções, visão do inferno mais dantesca que o dito do escritor Florentino.
Por mais que se esforcem em explicações, jamais conseguirei entender o que move as mulheres Portugueses a sacudirem as lusas celulites alimentadas a leitão, farinheira e pastéis de nata, ao som do samba, e com pele de galinha, debaixo desse “calor abrasador” proporcionado pelos oito graus centígrados da Mealhada ou os doze de Sesimbra.
- Alô, alô, minhas senhoras. No Brasil é verão e têm quarenta graus.
O ridículo destes “sambodromos” inventados entre as rotundas das nossas localidades só poderá ser equiparado ao despropósito e contra-natura de um possível Rancho Folclórico de São Luís do Maranhão a cantar e a dançar o “Malhão, Malhão”, ou um grupo de Esquimós, de braço dado à porta do Iglô, a cantar a “Menina estás à janela”.
E depois, em Sesimbra há escolas de samba com nomes como: Tripa Cagueira, Bota no Rego, Trepa no Coqueiro…
Por favor, tragam o Restaurador e o Petróleo Olex e apliquem-no sobre a cultura lusitana. Sem chauvinismo mas com orgulho pelas nossas tradições, restituam as nossas “cores” mais naturais.
Desligo o aparelho de televisão e resolvo ir fazer uma compras, apercebendo-me a determinada altura que estou a fazer slalom nos corredores do Centro Comercial por entre dezenas de crianças vestidas de princesas e fadas, que rodopiam desesperadamente sobre si procurando fazer um volumoso balão com as suas saias, esquecendo-se que as ditas, fabricadas com as “sedas” chinesas, jamais poderão responder ao seu desiderato por mais aceleração que imprimam ao seu rodopiar.
Fujo dali para fora em quase desespero gritando ao Gaspar que pode atentar-me com tudo mas eu jamais apresentarei a minha rendição e prometerei que nos dias "gordos" voltarei a “pecar”.
É cedo, o pecado está consumado, e já que está, que seja em plenitude e já agora sem samba e sem máscaras chinesas.
É terça-feira gorda, estou em Portugal, Cozido não vou comer porque quero guardar por mais tempo a memória do excelente que comi no domingo em casa da Mina e da Natália.
Auto-medico-me com um dos meus anti-depressivos favoritos: acelero para o Guincho, e fazendo as curvas do ponto mais ocidental do continente Europeu, ali entre o Abano, a Malveira da Serra e Colares, alimento-me do Atlântico que é só nosso, acabando o passeio em Sintra, na Casa do Preto, usando uma bica e uma queijada como ponto final para um parágrafo de excelência na história de um dia que por mais que os Decretos digam que não, será sempre “gordo”.
E lá chego então a casa muito mais animado, disposto até a enfrentar a quaresma que aí vem. Assim como assim, calvários, são coisas que por estes tempos nos são familiares. Excessivamente familiares.

Comentários

  1. Em tudo concordo menos numa coisa... Rendermos ao vilão... Não!!! Esses que aumento o produto Bruto ... Deles!!! Não!!! Esses que se vangloriam com os sacrifícios dos outros, como seus... Não!!! Esses que põem mais caro o pão... que do diabo amassou... Não!!! E Como o poema do Monstrengo... o disse: Rodopiou 3 vezes... e mais 3 e disse: Quem ousa sou eu e um povo como eu que sofre, mas que um dia dirá... Basta!!! Não, não e... Nâo!!!
    Abraço

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