Uma viagem na República Portuguesa

Há uma intensa neblina sobre o Douro quando de manhã chego à Alfândega ao mesmo tempo de uma “multidão” de pescadores que munidos das suas canas se perfilam alinhados gritando uns aos outros promessas de sucesso na sua actividade matinal.
Quando desço à hora de almoço já não estão nos seus postos ficando eu sem saber se desistiram ou se, tal como eu, foram engolidos pelos nabos, couves e garrafas de vinho do Continente em Feira de Sabores no majestoso edifício do Porto. Anuncia-se o Tony Carreira e por isso já há grades metálicas à frente das bilheteiras que vendem pulseiras cor de laranja, em tom fluorescente, ao jeito do “tudo incluído” nas estâncias de férias.
E a Alfândega ganhou ares de Pavilhão Atlântico.
Caminho ao longo do rio na companhia do meu querido amigo e colega Paulo Chinopa e acabamos por nos sentar numa mesa que espreita o Douro. Hoje tivemos sorte, ao contrário da noite de ontem em que só à segunda tentativa conseguimos jantar depois de numa primeira nos terem feito esperar meia hora sem receber o pedido e de terem apelado para a nossa compreensão pela falta de pessoal.
Depois de eu ter dito que falta de pessoal num país com 18% de desemprego não é compreensível, saímos deste restaurante que estando instalado na auto-designada “Capital do Trabalho” tem claros pecados que os Portuenses atribuem aos “mouros” de Lisboa.
E faço-me à estrada rumo a sul passando o Douro na Ponte do Infante falando ao telefone com os amigos para combinar as Migas Alentejanas que serão o pretexto do nosso macro almoço de amanhã. Quando passo por Gaia já falamos do Sericá e da sobremesa.
Só paro em Fátima onde já há ambiente de treze de Outubro e onde já se montam as estruturas que receberão os peregrinos que vindo a pé, de longe, de norte e de sul já se puseram a caminho. Mas hoje tive de parar em Fátima pois há uma amiga que está apreensiva este fim-de-semana.
E depois do Douro, do Vouga e do Mondego que passei nas pontes da A1, do Tejo que passei em Santarém na Ponte Salgueiro Maia e do Sorraia na Ponte de Coruche, chego a Vila Viçosa.
Percorri 460 quilómetros e passei por sete dos dezoito distritos do continente: Porto, Aveiro, Coimbra, Leiria, Santarém, Portalegre e Évora, ou seja 40% dos distritos.
Acresce que em todos os locais e com todas as pessoas com quem falei, o fiz na mesma língua, o Português, enriquecida e apimentada pelos diferentes sotaques, que a viagem foi acompanhada pelo mesmo sol com intensidade de Portugal e de que a roupa estendida nas janelas da Ribeira do Porto tinha o mesmo tom limpíssima da roupa que vi estendida durante todo o meu percurso.
No dia cinco de Outubro, data do Tratado de Zamora que ditou a independência de Portugal, e em 1910 da implantação da República, o meu dia acaba por contrariar quaisquer intuitos separatistas e regionalistas, apresentando-me eu como um certificado vivo e com pernas da unidade nacional.
O que nos une é muito mais do que o pouco que nos separa. E os quilómetros de norte até sul até se percorrem numa só tarde.
Com um prazer enorme de ser Português e um orgulho gigantesco pela terra que somos.
Viva Portugal.
Viva a República.

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