FLORBELA

Silenciado o impossível pelas asas soltas que tomarei do mais imponente condor, chegarei à tardinha quando a planície já repousar do fogo intenso, do dia em brasa ateado pelo sol do estio.
À tardinha… essa hora dos “mágicos cansaços”.
As árvores que todo o dia estiveram em prece sobre o canto dolente do ceifeiro sentem já o aroma do beijo do luar; de açucenas, de flor, do mesmo tom alvo da cal do monte que coroa a charneca.
Minha irmã de berço, liberdade e destino, eu saúdo-te no beijo por entre a cumplicidade rubra dos poetas, essa “casa” onde a alma emerge do opaco e negro tom dos dominós, da segunda pele que o mundo nos oferece e que nós despimos na ousadia e na suprema glória da coerência de nós mesmos; quando cumprimos aquilo que de nosso mais verdadeiramente existe: o desejo.
Aqui, somos loucos mendigos vagueando sob o olhar previsível dos Homens, que o nosso reino é de muito além-mundo, na pátria que só o sonho alcança.
Florbela...
Da alma, do destemido sentido de cumprir a vontade expressa por todos os poros, o amar que não cessa e se vive como quem respira… perdidamente, da única forma capaz de saciar a inquietude da nossa genética, cumprindo a vida.
E é tanta a vida que temos, que jamais caberá nos dias dos Homens...
Talvez seja preciso que partamos um pouco mais cedo, quando chegar Dezembro e o frio revestir a brisa de todas as praias.
Talvez a morte, senhora de braços ternos de um veludo suave, seja o único amparo para o soluçar triste que a demais gente não entende.
Que os nossos corpos se apaguem matando a fome às rosas para que a alma possa voar finalmente livre do cárcere da carne e de qualquer mundano detalhe, e possa voar; voar sobre a charneca e sobre o trigo, sobre o mar... na mais suprema liberdade.


("Um mês A GOSTO" / Dia 7 / Letra F / Proposta de José Falcão)

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