Sábado

A noite trouxe a sonora perseverança do vento no recorrente e estridente empurrar da chuva contra a vidraça.
“Gosto muito de ti”.
As palavras de amor, as que matam os silêncios, sobrepõem-se sempre a tudo e a todas as lembranças; e abraçam-se a nós no solitário frio de uma noite de tormenta.
Sigo pela saudade…
A manhã trouxe o sábado, mas sem que o sol conseguisse romper as densas nuvens que persistem neste choro sobre o nosso inverno.
Da vidraça molhada é hoje impossível espreitar o mar.
Mas há esse beijo matinal da minha mãe, secreto e mágico elixir que pelos dias me faz sentir menino. E há sorrisos e conversa à mesa na hora do pequeno-almoço.
Como sempre que estamos juntos.
Pela rotina do café, do jornal, do folhear dos livros na Bulhosa, das compras… deixo-me ir até à hora em que o Cozido de Grão já se denunciou e invadiu de aromas as escadas do prédio, uma espécie de “passadeira” sensorial para a família que chegará para o almoço, o código de acesso para quem carrega a genética e a paixão por além Tejo.
As nuvens persistem para lá da janela, mas quem repara nelas?
O João e o Luís soltam sorrisos pela casa. Agarramo-los e sorrimos também com eles.
Renascemos sempre no momento em que nos despimos da idade e embarcamos sem reservas no doce sorrir de uma criança.
E segue o sábado.
Segue a chuva.
Mas como chamar triste a um sábado assim?
Siga a vida…
Porque mesmo quando um minuto é triste há ainda 59 outras hipóteses para conseguir ganhar a hora.
E porque mesmo quando te dizem “não és de aqui”… há ainda um universo todo que pode ser teu.
Sempre a sorrir.

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