Excel Killer e o Bando dos Incapazes


Desconheço se Luís de Sttau Monteiro alguma vez terá tido a percepção de quão proféticas eram as palavras do título do seu romance “Angústia para o jantar”, concretizadas nas inúmeras comunicações feitas pelos políticos à hora em que as famílias se juntam à volta da mesa e as televisões transmitem os noticiários.
O primeiro-ministro Passos Coelho esteve ontem durante 27 minutos a explicar as “reformas” que operacionalizará no Estado com o objectivo primeiro de fechar a sétima avaliação da Troika.
O conteúdo da comunicação é de cariz incendiário e indutor de revolta, até do Português mais pacífico e tranquilo, e é sobretudo a prova de que em Portugal não se governa, pelo contrário, gerem-se orçamentos, e mesmo assim muito mal.
Há dois anos, quando solicitámos ajuda financeira ao exterior, os três maiores partidos assinaram um memorando que pressupunha desde logo um necessário ajuste no Estado e na sua organização para que as contas públicas conseguissem chegar a um equilíbrio.
Mandava o bom senso que os três partidos, estivessem ou não dentro do governo, tivessem trabalhado juntos no cumprimento dessa missão.
Mas após dois anos, os políticos fizeram o que melhor sabem fazer: política.
Os da oposição assobiaram para o lado e disseram não conhecer “o pai do mal”, e os do governo, muniram-se de folhas de Excel e foram aplicando modelos consoante o dinheiro que havia e os prazos para o conseguir.
Acho inadmissível que ao fim de dois anos no governo, um primeiro-ministro me venha dizer que faz cortes porque os credores os impõem, fazendo um percurso que começa no dinheiro disponível e acaba na estrutura e na máquina do Estado.
Teve tempo suficiente e tinha obrigação de ministério a ministério saber qual a organização necessária ao correcto e adequado funcionamento do Estado, incluindo o número de funcionários para a sustentar. Estou certo que eliminaria muitas gorduras e chegaria por uma via razoável e racional ao dinheiro que precisa poupar.
Mas quando só se gere o dinheiro disponível e não se olha de forma estratégica para as reais necessidades, umas vezes come-se lagosta e outras… enlatados de terceira categoria.
Nesta fase, a dos enlatados, chamaram um contabilista autista e desprovido de qualquer sensibilidade social, para com as suas folhas de Excel, fazer o “racionamento” e é claro que o resultado só poderia dar nisto.
Não deixo de achar importante que os funcionários públicos se alinhem com os funcionários do privado, mas por favor, nos deveres e também nos direitos.
Acho no entanto inadmissível o ataque às reformas sobretudo quando não têm expressão de dó ou piedade pela miséria de algumas delas e perante as manifestas dificuldades de quem as recebe. O Estado, uma pessoa de bem, falha inclusive no não cumprimento das expectativas de indivíduos que estão hoje reformados e que foram contribuintes exemplares durante a sua vida activa.
E quanto à idade de reforma passar para os 66 anos, seria conveniente olhar para a idade de reforma dos políticos. É irónico que um parlamento que aprove uma extensão da idade para a aposentação seja presidido por uma senhora que se reformou aos 40 anos de idade.
Ontem, para além da angústia de Passos, tivemos ainda de assistir à posterior sobremesa azeda da angústia de Seguro em entrevista à TVI e a uma Judite de Sousa em versão Dona de Casa de robe vestido.
Depois das ideias para o vazio, o vazio das ideias, e esta inevitabilidade no cumprimento do ciclo de mediocridade em que estamos envolvidos.
Haja alguém que diga aos políticos que as maiorias absolutas não se pedem, conquistam-se pela força das ideias e pela competência, e que esta ideia de chamar a “Sociedade Civil” para um consenso alargado é algo que já está esgotado e para o qual não há paciência.
Os que responderão à chamada até poderão não ter cartão partidário mas são aqueles que desprovidos de “tacho” desde o último governo Sócrates, quererão comprar o bilhete para um possível governo Seguro.
E as ideias continuarão mortas.
Já que de morte falamos, haja forças para os matar a eles todos antes que nos matem a nós… à fome.

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