O carpir da surpresa no velório do bom senso

Uma andorinha não faz a primavera mas o subsídio de férias dos funcionários públicos parece fazer o verão, e caso o Gaspar não pague rapidamente o dito, arriscamo-nos a ter calor só lá para Novembro, “gozando” da possibilidade de em Agosto trocar o Algarve pela neve da Serra da Estrela, aproveitando para ver o pelotão da Volta a Portugal em Bicicleta com uma inédita aplicação de correntes metálicas.
Mas que surpresa poderá isso causar num país que pára aos domingos à noite para ver em directo o José Sócrates a apontar o rumo para o país ou o José Castelo Branco a beijar na boca a sua Betty ao estilo “filho não gostas mas come a sopa que ela faz-te bem” (neste caso, à carteira, claro) antes de se atirar maquilhado e de saltos altos da prancha de cinco metros de uma piscina?
Em Portugal, a noção de surpresa está a sofrer uma estranha e rapidíssima mutação, sendo previsível que ela possa mesmo eclipsar-se de vez às mãos homicidas deste rótulo de normalidade atribuído ao comportamento esquizofrénico das figuras públicas, dos governantes e dos líderes de opinião.
Nesta linha e também na do “passa a culpa ao outro e livra-te imediatamente dela” que caracteriza a nossa cena política, o ministro recordista da austeridade, das olheiras e do discurso pausado, indicou recentemente que o excesso de chuva é causa para grande parte dos problemas que a nossa economia enfrenta pelo impacto negativo na construção civil.
Maldita chuva!
Nós com tanto dinheiro para gastar na construção de casas e ela a não deixar trabalhar os pedreiros.
No discurso político como nas conversas de circunstância, a meteorologia é sempre um bom recurso quando não há mais nada de jeito para dizer. Só que no âmbito da política, pela pertinência e pelo impacto na vida dos cidadãos, ela motiva desde logo uma resposta positiva a todos os critérios indicados para o diagnóstico de esquizofrenia que constam do DSM-IV (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders).
Em condições normais, claro.
Pelo contrário, aqui tudo é possível, não deixando de estar implícita a urgente necessidade de um colete-de-forças.
E é neste contexto que soa estranho que de vez em quando alguém faça apelo ao bom senso em questões polémicas como a greve dos professores aos exames ou então relativamente á aplicação razoável dos recursos de forma a manter a prestação de cuidados de saúde de qualidade.
Bom senso?
Morreu há muito e quem não o tem para oferecer, nunca terá legitimidade para o reclamar.
Haja alguém que dê o tom pelo exemplo e permita afinar a orquestra onde para já ninguém se entende… ou pode entender.

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