O Dia de Corpo de Deus

Não sei se têm a noção de que hoje, dia 19 de Junho de 2014, não fora a má gestão e a incompetência de quem nos obrigou a chamar a Troika (e não vou aqui apontar directamente os culpados pois esta discussão acaba sempre ao estilo Madalena Iglésias versus Simone de Oliveira, consoante as simpatias partidárias); mas hoje, dizia, estaríamos a esta hora a regressar a casa depois do gozo de um Feriado Nacional, o Dia de Corpo de Deus.
Os católicos talvez tivéssemos ido à missa ou à procissão, e os não praticantes, ateus, agnósticos e afins, talvez tivessem acudido a algum areal da Caparica, já que o dia esteve muito convidativo para uma ida até à beira-mar.
Já que nos acusam tantas vezes de memória curta, aqui fica pois esta menção que contraria esse princípio.
Eu não me esqueço, porque tenho memória; mas esperteza não devo ter muita pois não entendo a importância estratégica de tornar laboráveis estes dias que há muito eram festivos e de descanso.
E juro, não cheguei hoje a casa com a sensação de uma coroa de louros no alto da cabeça por ter ido ajudar a salvar o meu país da bancarrota, um herói ao estilo de Camões agarrado ao manuscrito de “Os Lusíadas” depois de um naufrágio.
Se vocês fizerem um dia um Pudim Mandarim, experimentem a juntar ao preparado, duas claras batidas em castelo. Dizem que o pudim ganha uma consistência idêntica aos pudins de ovos de confecção caseira, o que é claramente mentira. O selo de Mandarim continua lá na consistência e no sabor.
Abolição de feriados?
São “claras em castelo” para disfarçar o problema que continuará lá eternamente.
Mas como sou um homem de memórias e para não deixar passar em vão este dia, cheguei a casa e não dispensei procurar o ano da minha primeira comunhão, já que era esta a data para tal celebração em Vila Viçosa.
Foi no dia 21 de Junho de 1973 na Igreja de Nossa Senhora da Conceição numa missa celebrada pelo saudoso Padre Reia e sendo minha catequista a também saudosa D. Mimi Lisboeta.
Tenho diploma, medalha no fio e uma foto “impublicável”.
Todos envergando um hábito branco, recordo-me de termos feito o percurso de São Bartolomeu para a Igreja de Nossa Senhora, no Castelo, dois a dois, de mão dada, sendo meu inevitável companheiro, o Manuel. Quem mais poderia ser?
A fila era imensa e atrasava-se sempre porque um de nós perdia os sapatos e tinha de se agachar para voltar a calçá-los; o dinheiro nunca era muito, nós crescíamos rapidamente e as mães compravam sempre os sapatos com alguma folga.
Depois da missa fomos todos até ao refeitório do Seminário de São José beber um cacau quente que era feito com um preparado comprado na Pérola Calipolense e que me recordo ser fantástico.
Foi assim há 41 anos e era feriado por ser Dia de Corpo de Deus.
Hoje já não é feriado mas eu quis terminar o dia a recordar o porquê de já não ser, demonstrando de caminho que podem levar-nos as festas, os subsídios, as férias… mas há duas coisas que nunca nos levarão: a memória e a vontade de mudar um destino tecido pela mediocridade.

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