Uma absurda obsessão pela tragédia
Com
mais ou menos fundamento, e com mais ou menos influência da nossa História
antiga e recente, há em nós Portugueses uma quase absurda obsessão pela
tragédia.
Não
é raro que quando alguém vem ter connosco e desabafa:
-
Sabes que tive um acidente e parti os dois braços?
Nós
respondamos:
-
Tiveste muita sorte…
Concluindo
logo de seguida:
-
É que poderias ter morrido.
Mas
a sorte associada a um acidente e à fractura dos dois braços é algo que efectivamente
soa a muito estranho, a não ser para nós que pomos sempre o destino muito para
lá da fronteira do jazigo.
Agora
que a Selecção Nacional de Futebol saiu do Campeonato do Mundo sem grande
glória, o coro dos trágicos lá voltou a atacar com argumentos do tipo:
-
“Pelo menos o Cristiano Ronaldo marcou um golo”;
Ou:
-
“De todas as selecções europeias eliminadas, a nossa foi a que conseguiu maior
número de pontos”;
Ou
ainda:
-
“Afinal até não foi mau porque só fomos eliminados pela diferença de golos”.
Pois
foi, saímos eliminados como os demais e ao jeito dos dois braços partidos, mas
ainda tivemos muita sorte. Porque até poderia ter caído o avião no regresso de
campinas…
Um
aluno que tire dez num exame tem uma óptima nota, pois poderia ter reprovado.
18%
de desemprego é excelente, poderíamos estar todos desempregados e a dormir na
rua.
Se
nos fixarmos no terrível mais negro que nos possa acontecer até a mediocridade
se torna aceitável.
Neste
contexto da tragédia também é fácil “desenhar” e inventar heróis. O
guarda-redes Beto chorou porque foi substituído e foi desde logo “trasladado”
para o altar dos heróis porque as suas lágrimas eram da cor das dores da
pátria.
Por
favor, este homem foi o que afirmou depois da final da Liga Europa que ganhou
ao Benfica pelo Sevilha, que o facto de ter ganho a uma equipa Portuguesa ainda
lhe dava mais gozo.
Herói
nacional? Com este conceito estranho de pátria, o homem estava a chorar pelas
dores na barriga ou então porque o regresso antecipado a Portugal lhe diminuía
consideravelmente o prémio de jogo.
Ainda
associado a esta prática também é comum que alguém conclua no final que:
-
“Afinal tinha sido possível”.
Já
assim foi em Alcácer-Quibir com o desejado D. Sebastião e mais recentemente na
final europeia com a Grécia.
Até
o PEC IV ainda entra nesta onda.
Já
li hoje o mesmo relativamente à goleada ao Gana.
Meus
amigos, acreditar dá sempre muito mais jeito antes de um desfecho irreversível.
Mais tarde, para além de ter o inconveniente sabor de uma sopa ingerida depois
do almoço, já não consegue ajudar muito a mudar o destino.
Concluindo,
tivemos uma prestação fraca no Mundial de Futebol. O Cristiano Ronaldo é
indiscutivelmente o melhor jogador do mundo mas a grande maioria dos seus
companheiros de selecção não é lá grande coisa, e o facto do Paulo Bento ser um
treinador que nunca ganhou mais nada para lá de umas Taças de Portugal, também
não ajuda muito.
Sem
explorações pela área negra da tragédia, com objectividade e sem resignações;
que assim com total apoio da razão, se cresce e se altera o rumo negativo que possa
ter a História.
E
sem que nos contentemos com pouco.
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