Os caçadores de piolhos

Um dos desportos mais em voga é a caça ao piolho, designação que eu atribuo aquele hábito tão lusitano e com raízes na inveja pura e dura, de conseguir descobrir algo menos positivo, um “piolho”, por entre uma amálgama infinita de excelentes atributos; dando então de seguida um desmesuradíssimo destaque a esse pequeníssimo detalhe que passa a ser o núcleo de qualquer apreciação.
Um exemplo:
- O Cristiano Ronaldo é o melhor jogador do mundo.
- Sim…mas já viste como a irmã é pirosa?
Outro:
- O Jorge Jesus foi campeão pelo Benfica.
- Sim filho… mas a mascar pastilha daquela maneira…
E ainda outro:
- A Ana Moura tem uma voz fantástica.
- Sim… mas aquele vestido semi-transparente do concerto do Coliseu…
Como se a forma de mascar pastilha ou a existência de uma irmã “pimba” fossem essenciais para ganhar jogos de futebol ou um vestido fosse fundamental para se afinar um fado.
Nesta caça, tal como em todas as outras, há também aqueles que regressam sem peças conseguidas, mas mesmo assim nunca se atrapalham e deixam algo no ar:
Um exemplo:
- A Julia Roberts é muito gira.
- Sim… mas tem ali qualquer coisa que eu não consigo explicar e que não me agrada.
Outro exemplo com algumas diferenças:
- O Mourinho é o melhor treinador de futebol do mundo.
- Sim… mas consta que para chegar onde chegou houve ali um não sei quê.  
E às vezes já não se fala sobre mais nada a não ser “o não sei o quê” destas criaturas.
Tal como eu já referi, esta prática da Caça ao Piolho tem raízes na inveja e também no assumir da postura de que na vida andamos todos a competir uns contra os outros; e elogiar alguém é então dar trunfos ao adversário.
E trunfos que podem ser decisivos.
Esta prática tem também alguns contornos de âmbito religioso e é muito treinada em sacristias e sucedâneos, pois na ânsia de chegar ao Céu rapidamente e até antes de morrer, qualquer beata gosta de se elevar ao estatuto de santidade, empurrando os outros para um nível um pouco mais abaixo atando aos outros os atributos mais negativos e cabeludos, ao jeito de pedras para que se afoguem rapidamente no mar.
Estou certo de que todos temos exemplos…
Ontem ao colocar no Facebook a foto que tirei em Petra ao lado de um velho Beduino que tocava um instrumento feito de pele de cabra e com uma crina de cavalo, houve logo alguém que comentou:
- A tua T-shirt ocidental é que não fica bem.
A minha T-shirt por acaso até era um pólo passou a ser o elemento mais importante da foto… e não precisam de ir ver quem fez o comentário porque eu já o apaguei.
Feito o meu diagnóstico deixem que vos diga que a malta anda a precisar da terapia do elogio e do positivo no sentido de acabar com esta prática infeliz e ridícula da Caça ao Piolho.
Tendo no entanto presente, e ressalvo, que aquilo que for seriamente negativo deve ser referido e combatido com veemência. Mas apenas o que valer a pena por ser importante.
É que se formos reler a História e já que falei de religião, repare-se que Jesus Cristo combateu seriamente os grandes pecados da humanidade; e nos outros detalhes era muito mais de dar e receber beijos do que de atirar pedras.

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