Os aromáticos dias do imprevisto


Para quê desesperar em prévio sofrimento com a perspectiva negra do que quer que seja, se até o calendário nos surpreende e nos oferece generoso, dias de verão em final de Outubro, algures entre o “verão que amadurece os marmelos” e o “verão de S. Martinho”, duas “instituições” de que sempre ouvi falar aos meus avós.
E apesar de sabermos que “Outubro quente traz o diabo no ventre”, também não esquecemos o muito que já choveu, e assim, “Outubro meio chuvoso torna o lavrador venturoso”; e estamos garantidos…
Que de chuva e sol se querem os meses e se compõe a vida, tão mais pobre quanto mais monótona e previsível.
De cada vez que regresso do Alentejo trago comigo um pão de meio quilo que deixo ficar duro para poder preparar uma Sopa de Tomate daquelas que importam para a minha cozinha, os cheiros por entre os quais cresci.
Frito as “capelinhas”, escolho o fruto maduro, tempero de orégãos, acrescento um ovo, o pão partido em “sopas”… e o jantar fica perfeito.
No meu prédio e à frente do meu apartamento, vive há vinte anos a minha vizinha D. Maria, Angolana, que insiste em preparar os seus pratos de uma forma tão intensa de sabores, que não há ninguém que saia dos elevadores e fique indiferente a tão fantástico perfume.
Ontem à hora do jantar e por ser Segunda-feira, a D. Amélia da empresa “Ferro Expresso” veio a minha casa recolher a roupa para engomar e viu-se de repente no epicentro de um dueto Alentejano-Angolano entre uma Sopa de Tomate e uma Muamba de Galinha, com os quiabos em agradável sintonia com o pimento verde e os orégãos.
Confessou que já não queria sair dali do meio daquele encontro com tanto de imprevisto quanto de bem cheiroso.
E os dias melhores são como os patamares onde se misturam aromas num inédito casamento.
Os dias do imprevisto de onde às vezes nasce um verão em pleno Outono.

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