A Cúmplice do Sol
Soa
sempre a uma infinita saudade, o triste dobrar dos sinos que sentimos tão demasiado
próximo sempre que a morte nos convoca a entrar no Castelo pelas Portas de
Estremoz.
A
rua estreita amplia o toque metálico e fá-lo acertar com os nossos passos
arrastados em direcção à Senhora da Conceição, atrás de quem os Calipolenses
fazem questão de se devolver à terra.
É
Alentejo e verão, o sol queima nesta manhã de domingo quando entre muros e
pedra, um mar de branco cruzamos no jardim que entre muralhas é guardião das
memórias do meu “povo”.
O
sol reuniu a sua máxima intensidade e está aqui presente como todos nós para um
brevíssimo adeus à D. Catarina, uma grande amiga, uma generosa cúmplice do sol
que tantas vezes nos ofereceu “luz” aos sorrisos dos nossos dias passados.
No
dia 5 de Julho de 1981, fez na passada sexta-feira 32 anos, eu cumpri o meu 15º
aniversário. Era domingo e nós vivíamos em casa a dupla tristeza da partida em
apenas 12 dias dos meus avós maternos, a Avó Francisca no dia 21 de Junho e o
avô Joaquim que tinha sido sepultado na véspera.
A
D. Catarina convidou-me para lanchar, como aliás tantas vezes acontecia,
colocou sobre um pequeno bolo, as velas do bolo de aniversário da festa que em
Março tinha preparado ao filho da mesma idade, o meu inseparável amigo Manuel.
E com ela e com o meu amigo, os três juntos e a cantar os parabéns, eu tive uma
festa na tarde dos meus 15 anos.
Não
foi em vão que falei em sol.
Ontem
reuni alguns amigos para que entre conversas e muito riso, eu pudesse celebrar
os meus 47 anos. O Rui preparou o bolo de aniversário mais bonito e fantástico
que alguma vez já tive, mas na tarde, no cantar dos parabéns e por sobre o
partir do bolo, reinou uma saudade imensa nascida da notícia que a manhã triste
me trouxera por SMS: “Já partiu”.
Os
afectos sobrepõem-se sempre à perfeição de tudo e de todos os momentos.
Na
noite quente de Vila Viçosa com muita gente sentada à porta buscando o fresco
que insistia em não chegar, no velório, encontro na Igreja de Santo António, o
Manuel, o Paulo Geadas e o João Paulo. Há muitos anos que não estávamos juntos.
Tal
como antes debaixo da laranjeira em frente à sua casa na Praça, de onde tantas
vezes nos chamava para um Sumol, uma broa ou um “Sameiro”, a D. Catarina congregou-nos
na sua partida para um serão diferente.
Rezámos juntos, cumprimentámo-nos, conversámos, sentimos a amizade que o
tempo e a distância não destruirão nunca, a amizade nascida desta herança e
cumplicidade do sol, a amizade que perpetuará entre nós, eterna nos corações de
todos, a D. Catarina, definitivamente uma das mulheres mais generosas que a
vida me ofereceu conhecer.
Nao poderia estar mais de acordo com o texto e em especial a ultima frase. Conheco poucas como ela. Era de facto uma pessoa fantastica.
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