A lua e as suas sombras


Desperdiça demasiada vida quem se senta à espera que o sol lhe tempere de cor as árvores e as ervas do campo; se a lua oferece à noite sombras infinitas que ficam à mercê do tom que lhe queremos dar.
E das sombras “colhemos” tantas histórias.
Conheço quase de cor as curvas do caminho, os detalhes todos que ladeiam a estrada por onde sigo de Vila Viçosa a Lisboa sob o luar intenso dos primeiros dias de Março. Sei que ali à direita e antes de chegar a Montemor-o-Novo há um sobreiro adormecido e centenário, uma árvore semelhante a uma taça gigante tecida de troncos carregados de vida pela sua generosidade e pelos tantos anos que já atravessou.
Hoje vejo-a como uma sombra perfeita na verticalidade da sua morte que oferece berço a tantas vidas.
E o poeta, que pode não ser um escritor; que a poesia é sempre coisa que se sente e que se pode expressar por qualquer dos sentidos, fixa-lhe os contornos e leva-a consigo na lembrança durante muitos mais quilómetros.
A perseverança de uma árvore é semelhante à fé de quem vive um grande amor.
Hoje, eu que sou sombra porque despido de cor pela saudade de te não ver, sinto nos meus braços e em cada detalhe do meu ser, a vida toda que me dás semeada por cada palavra, cada beijo, cada abraço…
E embora veja turva pelas lágrimas, a minha história que passa agora pelo escuro da estrada como na sala apagada de luz de um cinema, eu sei que o que vejo é o que eu quero ver, e sou eu, irmão de uma árvore do Alentejo…
Eu jamais deixarei de te amar assim, mesmo depois do dia em que a vida me fizer morrer.

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