Há muito me habituei a não desperdiçar quaisquer palavras…


Há muito me habituei a não desperdiçar quaisquer palavras, e se não estás à minha frente para que de viva voz as possa transmitir, registo-as e guardo-as escritas no caderno vermelho que anda sempre comigo e que um dia um querido amigo me ofereceu num pequeno-almoço no Chiado.
Sobre o restaurante paira em tom baixo, a banda sonora que acaba por resultar numa jangada ou bote salva-vidas para os solitários, salvação a que nos agarramos por pensamento para nos abstrairmos e sobrevivermos ao mar de gritos dos grupos de gente que estão sentados ao nosso lado.
E de repente por entre algumas melodias mais ou menos conhecidas e interpretações mais ou menos “de elevador”…
África Minha, um voo de Redford e Streep no Quénia enquanto dão corpo às palavras e à paixão de Karen Blixen; e aí estou eu indiferente às ruidosas gargalhadas que culminam as piadas da gente presente na sala, a voar contigo naqueles territórios tão generosos em palavras pela intensidade do que se sente.
O vento bate-me forte na face mas eu agradeço-o à sorte, tal o aroma de ti que ele me oferece; o voo acelera por entre as árvores e as aves de todas as cores e tem um toque marcado de perfeição, quando até as vertigens se apagaram porque todos os medos, excepto um, morrem quando eu estou contigo.
Esse um… o medo de te perder.
E a vida é como um serão de onde eu vou colhendo palavras que registo no caderno vermelho estrategicamente colocado do meu lado direito na mesa do jantar; os recados que guardarei para te transmitir quando te reencontrar, sem qualquer desperdício de palavras e de sentimentos.
De repente dou conta de que algures na zona das gargalhadas histriónicas, uma senhora me olha com ar espantado; acredito que seja por me ver sozinho, a escrever e a não conseguir travar o sorriso em alguns momentos; sorriso que não está alinhado com a cadência de piadas da sala.
Definitivamente não me entende; mas estivesse ela a viver uma paixão e a voar assim como eu o faço contigo...

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